terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Poema - Lágrimas de Amor

Olá!

Apresento a vocês um poema de uma escritora muito talentosa que em breve deve lançar um livro ^^.


Lágrimas de Amor


Por muito tempo desacreditei
Nas lágrimas que em tanto chão deixei
Nas batalhas que muitos travaram
Já sem esperança de poderem viver aonde estavam

Da terra as raízes de amor se puserem
As crianças por sublime magia se propuseram
A buscar, a acreditar, a sonhar
Como pude esquecer que vi isso em cada olhar?

Quando soube então que do teu solo se colhia
Em prantos me pus, evitar não podia
Com toda a sinceridade do meu coração
Agradeço à mãe terra em grandiosa oração

Pois minhas lágrimas não banham mais o sertão por tristeza
Elas caem e emocionadas cultivam com gratidão a terra
Que antes foi de grandes e agora é de muitos, rica em paz sincera

(Dora Lima)

domingo, 3 de novembro de 2019

Inveja da Ficção


Inveja da Ficção


Estive bastante ocupado nos últimos meses com atividades e problemas que diminuíram substancialmente a minha produção para blog. Mas estou de volta com meu trabalho, principalmente na data de hoje, em que completamos 2 anos de Pena Capital.

Sou sincero em dizer que tenho inveja do roteirista por trás da conjuntura brasileira atual. Creio que Machado de Assis, Clarice Lispector, Victor Hugo, Rachel de Queiroz, Cecília Meireles, Guimarães Rosa, Victor Hugo, Balzac, Tolstói, Dostoiévski, José Saramago e muitos outros grandes nomes da literatura seriam absolutamente incapazes de fazer qualquer texto literário com metade da complexidade da América do Sul atual. Ninguém seria capaz de imaginar personagens e ações tão atípicas e complexas em tão pouco tempo.

A Venezuela vive a maior crise, a capital do Equador chegou a ser alterada, a Bolívia vive uma profunda tensão política nas eleições, Chile vive um caos social que coloca em xeque o paradigma neoliberal e a Argentina não decide qual é o melhor modelo político a seguir desde o início deste século. Definitivamente, vemos um continente em indignação e perdido no caos. Nessa conjuntura, qualquer colocação ou previsão, por mais absurda que seja passa a ser verossímil, até mesmo para os analistas mais comprometidos e exigentes.

O Brasil também não podia ficar fora dessa zona da confusão. O nosso presidente tem o dom de criar crises e se queimar das maneiras mais toscas possíveis. Cogitou seriamente colocar seu filho como embaixador, mas, ainda bem, o Senado fritou essa ideia como um hambúrguer do estado do Maine. Para continuar a tragédia, nosso exibidor de faixa presidencial foi bancar o sincerão com um fanático seguidor e acabou iniciando uma profunda crise no seu partido de todos os lados. E ainda fica deixando ministros de baixíssimo nível, como o da Educação e do Meio Ambiente, fazerem trabalhos desprezíveis. O amigo do Queiroz também tem um dom verdadeiro de fazer os outros perderem tempo com suas bobagens, já que deixa o egoísmo e a vaidade tomarem conta de suas ações políticas e pessoais.

Por fim, há o personagem mais complicado de se entender: o grupo de pessoas que apoiam cegamente Bolsonaro. Em seu Twitter, principal fábrica de Golden Shower do país, ele fez uma comparação com o governo Dilma, parecido com o complexo do PT de se comparar o tempo todo com o FHC. Dentre os dados está a comparação entre o crescimento do PIB: -3,6% de Dilma contra +0,8% de Bolsonaro. Como pode um imbecil como Bolsonaro defender que um crescimento pífio e ridículo desses do PIB é algo para se comemorar? É absolutamente intangível colocar esse crescimento como algo para se orgulhar. O Brasil continua uma vergonha desde o início do segundo governo Dilma, e este governo não está sendo capaz de tirar o país da crise, pois perde muito tempo com bobagem e com decisões equivocadas.

No fundo, eu queria que fosse realmente uma ficção em que, ao se fechar o livro, voltamos para a realidade, mas, infelizmente, não será assim. Ainda viveremos um mundo ficcional complexo e surreal que desafiará nosso senso de realidade dia após dia.
(Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 12 de julho de 2019

Diário: 22 de junho de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven)

22 de junho de 2012.

Hoje eu me peguei pensando: que dia é hoje? Não digo nem dia com número e mês não, mas dia da semana. Eu sinceramente não sei que dia é que dia. Tanto faz a segunda, a sexta ou o sábado para mim. São dias em que sou cheia de obrigações que torcem a minha porta, a minha roupa e a minha alma. Talvez, por isso minha família olhe para mim com um olhar mais cínico e queira me presentear com a ausência de trabalho no meu fabuloso aniversários. Afinal, as pessoas gostam mesmo é de serem servidas pelas outras neste país.

Será que sempre foi assim? Quando a gente serve aos outros esquecemos da gente em vários momentos. Às vezes eu me pergunto: e agora? Me sinto um personagem de um poema do Drummond diante da vida, aquele José. Minha filha vive falando essa expressão em tom de brincadeira aqui em casa quando algo sério acontece. Esses dias ela viu a Dilma sem graça na televisão e falou em tom de deboche: “e agora, Dilma?”. Agora que ela não é nenhuma novidade para ninguém, todo mundo está colocando as manguinhas para fora neste país para criticá-la. Começa com deboches e sabe-se lá como termina.

A minha família acha que consegue esconder de mim os planos deles para o meu aniversário. Estão muito errados. Passo o dia inteiro em casa cuidando das desarrumações deles e sei cada pista que eles deixam sem nem perceber. A Giovana, com o salário dela de professora, comprou um vestido da C&A e o Daniel, com a ajuda da Rayane, comprou uma sandália mais bonita para mim. Duas coisas que eu nem sei quando vou usar com ou sem a minha família.

Com tudo isso, no final do dia me olhei no espelho e disse para mim mesma: “e agora, Márcia?”. Acho que a resposta a essa pergunta seria o meu verdadeiro presente de aniversário. Às vezes acho que o fim do mundo neste ano não seria uma coisa tão ruim assim.

sexta-feira, 5 de julho de 2019

Diário: 20 de junho de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven)


20 de junho de 2012.

O mundo está bem esquisito para mim. Sinto que estou no meio de uma névoa sem paisagem de fundo. A vida de certa forma é assim mesmo: névoa pura no meio da escuridão do mundo. Ando meio triste mesmo. Acho que eu era muito iludida com a vida. Eu esperava chegar à idade que eu tenho pronta para comemorar e celebrar a vida como ela é. Mal sabia eu como realmente era a vida. Se eu soubesse que na Capital da Esperança eu iria encontrar tamanha solidão em frente a um balde, um pano, um rodo, roupas e todo tipo de sabão. 

Todo dia eu penso naquele livro do Fernando Pessoa. Ele era capaz de contemplar a vida com uma beleza singular digna da felicidade até nos piores momentos. Se bem que nem ele nem eu passamos pelos piores momentos da vida. Nunca enfrentamos uma só guerra, uma só miséria de fato. Na verdade, eu não sei muito sobre a vida do Fernando Pessoa para dizer isso, mas eu acho que ele nunca passou por nada demais.

Voltando aos panos e às roupas, vou confessar uma coisa para o meu diário. Eu já tentei falar com os materiais de limpeza. Acho que tenho uma relação mais próxima com eles do que com a minha família. Essa é uma verdade que me dói bastante. A verdade é uma dor imensurável. Nossa como eu reclamo da vida.

Pelo menos vai ter as Olimpíadas para me distrair um pouco aqui em casa. E vai ser em Londres. Dá para ver todos os eventos importantes durante o dia. Na da China eu não consegui ver quase nada direito por conta do horário. Pelo menos assim a faxina fica mais agradável para mim. Talvez eu até fale um pouco com os atletas, pelo menos é melhor do que falar com coisas.

sexta-feira, 28 de junho de 2019

Um Empate Vale Mais Que Mil Palavras

(Ilustração feita por Enthony Keven)



Um Empate Vale Mais Que Mil Palavras


O Brasil conseguiu uma vitória singular na última noite pela Copa América. Em tempo me corrijo: empate sem gols seguido por uma vitória chorada nos pênaltis. Apesar do sofrimento, a verdade é que a classificação independe do espetáculo. Desde Pelé queremos o espetáculo em campo. Improvisar, criar, driblar e subverter a lógica do futebol são nossos traços típicos das nossas obras cinematográficas feitas em campo. Se bem que em tempos de seriados, um pouco de drama até o fim da temporada ajuda a cativar qualquer aficionado.

O Paraguai conseguiu segurar o 0x0 com um êxito indiscutível. Eles entraram em campo com esse objetivo acima de qualquer coisa. Parecia um jogo típico de Libertadores em que o adversário faz de tudo para não deixar a bola entrar e deixar o adversário entrar em profundo desespero psicológico. Como nossos “meninos” são criados na Liga dos Campeões da Europa (não há motivo para falar o nome em inglês!), não sabem, com exceção do Atlético de Madrid, o que é um time querer amarrar o jogo como um sequestrador amarra os pulsos da vítima

Esse é o problema e eu o explico melhor para quem não entende. Nossos “garotos” se acostumaram tanto a enfrentar equipes indispostas a abdicar de seus dotes ofensivos que se sentem perdidos diante do adversário, como uma criança que tenta andar de bicicleta pela primeira vez. O único que demonstrou o verdadeiro brasileirismo no futebol foi o Cebolinha. Obviamente, um jovem que teve como conselheiro e doutrinador Renato Gaúcho, conhecido vulgarmente como Renight nas baladas nacionais, não poderia fazer outra coisa. Tenho certeza de que seu mestre lhe disse: “entra, arrebenta e mostra que é abaixo da linha do Equador que se joga futebol de verdade!”. Infelizmente, nem esse talentoso e irreverente craque foi agraciado pelos deuses do futebol com um gol. Um dia explicarei a vocês sobre os deuses do futebol, que de certa forma são a síntese de vários deuses. Por enquanto, ficaremos com o jogo de ontem.

Tentamos de todo o jeito o gol, parecíamos a música do Skank, só que sem a parte do gol. Nem a expulsão com uma falta a um centímetro da entrada da área foi suficiente para fazer o gol. Na verdade, o Brasil, que não faz gol de falta há cinco anos, deveria trocá-la por um lateral para ver se cria alguma coisa mais eficaz. Do jeito que foi o jogo, era provável que os nossos vizinhos conseguissem segurar o empate mesmo com 4 jogadores a menos. Fomos aos pênaltis e muita coisa nos angustiava. Gatito vinha com uma moral monstruosa depois de alguns milagres em campo diante de Alisson. A princípio eu também me angustiei, afinal Alisson sempre agiu como um galã e, conforme eu postulo, qualquer jogador pode se arrumar e ter hábitos de galã de novela, menos o goleiro. O goleiro tem de ser esquisito, perturbado e, preferencialmente, muito feio.

Minha fé começou a mudar quando percebi que o Alisson bebia água de forma escalafobética e sequer tinha acertado o lado em que aconteceriam as cobranças, tendo de vergonhosamente ir até a outra baliza para o início do maior suplício dos craques da bola. Esse momento lhe foi decisivo, sem dúvida. Ademais, encontrava-se bem desarrumado e pouco cuidado, enquanto o seu rival tinha o cabelo intacto após uma partida exaustiva. Nesse momento, foi semeada a nossa vitória.

Após o erro do zagueiro paraguaio na primeira cobrança, todos acertaram, até o erro de um atacante que joga na Europa. Foi aí que bateu o desespero, logo dissipado pelo desperdício da última cobrança dos nossos adversários. No ato final e necessário, o nosso Jesus fez o milagre de acabar com a hegemonia paraguaia nos pênaltis e decretou o maior milagre da noite: Gatito Fernández não pegou nenhuma das cinco cobranças. Sim, a minha teoria sobre goleiros se mostrou mais uma vez hegemônica e irrefutável.

Agora é enfrentar e vencer a Argentina no Mineirão. Sim, só a vitória interessa no jogo da próxima semana. Messi parece obcecado, já que tem o sonho de ser o herói de um título argentino, que não vem há 26 anos. Tomara que esse tabu perdure por muito mais tempo.

(Fernando Fidelix Nunes)

Diário: 17 de junho de 2012

(Ilustração de Enthony Keven)

17 de junho de 2012

Meu aniversário de 53 anos está chegando... e daí? Quando somos crianças cada ano passa devagar e tem um especial sabor do florescimento de uma nova vida. Já na velhice o aniversário é a frustração da perda do sentido de cada dia. Quando eu tinha 12 anos, sonhava em ter 20 anos para ser uma mulher realmente feliz. Hoje, também sonho em ter 20 anos de novo. Fico pensando como a minha vida pode ser diferente. Confesso que esse “lance” de velhice, como diz o Daniel, está martelando na minha cabeça.

Resolvi pegar um livro verde do Drummond que estava na estante da minha filha. É chamado de “Prosa Seleta”. Tem vários livros dele com muita coisa boa. O meu predileto é “O Avesso das Coisas”. Ele faz uma espécie de coletânea de frases bonitas sobre todo tipo de assunto do ser humano. Como nesse tipo de livro o interesse de quem lê está acima de qualquer ordem em que o autor tenha colocado a obra, fui logo para o ponto da velhice. E ele fala muita coisa disso.

As que eu mais gostei foram:

– A velhice tem atitudes infantis, sem o encanto da infância.
– Tentamos consolar os velhos chamando-os de velhinhos.
– A vida é breve, a velhice é longa.
– Suportar o peso da idade é a última prova de juventude.
– Pedir benção dos velhos dá-lhes a ilusão de terem poder de abençoar.

Isso sim é um escritor de verdade! Um dia talvez eu consiga extrair do cotidiano a vida que ele extraiu com tamanha beleza em palavras. Pena que o tempo tem extraído de mim mais do que a beleza juvenil que inundava meus olhos e minha alma.

sexta-feira, 31 de maio de 2019

Diário: 12 de junho de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven para este blog)


12 de junho de 2012.

Ser uma mulher casada que se sente sozinha é bastante complicado. Chega uma hora em que o casamento deixa de ser a verdadeira paixão e passa a ser apenas uma formalidade sobre a vida. Nós permanecemos unidos um ao outro não por amor, mas por conveniência. Sendo sincera, acho que nunca nem passei pelo estado da verdadeira paixão com o Henrique. Nunca amei o Henrique de verdade. Acho que tive a fantasia de pensar que o casamento poderia ser uma saída para o sofrimento perene da vida. É só o amor que dá sentido à vida. Talvez, seja por isso que eu nunca tenha conseguido encontrar um sentido pleno para a minha existência.

A vida caminha a passos largos e eu, pobre mortal, caminho passo a passo para a escuridão da vida. Ninguém sabe a dor verdadeira que o outro sente, mas a minha parece ser maior do que as demais. Nossa! Acho que ando vendo bastantes pedras no meio do caminho. Acho que deveria fazer uns poemas para relaxar um pouco. Escrever versos é melhor para aprofundar-nos tudo em todas as palavras. É... ando pensando bastante coisa e não fazendo nada. Esses dias mesmo eu pensei em pedir para o Henrique pagar uma faculdade para mim. Acho que eu iria querer fazer direito. Conhecer as leis seria o máximo. Só de imaginar as pessoas me perguntando sobre as leis em busca de orientação, eu fico muito mais animada. Afinal, é muito melhor quando te perguntam sobre as leis do que sobre limpeza e culinária. Fazer o quê? A vida é assim mesmo.

Acho que hoje consegui cumprir minha promessa de passar a escrever só sobre mim e o que eu sinto. Nada de falar de datas ou coisas tenebrosas da vida pretérita. Nossa! Acho que ler o Drummond (finalmente aprendi a escrever o nome dele direito!) está me deixando com o vocabulário melhor. Desse jeito vou levando até jeito para ser advogada. Vamos ver aonde a vida vai dar.

sexta-feira, 24 de maio de 2019

Diário: 31 de maio de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven)


31 de maio de 2012.

A Giovana está muito chateada. O governo resolveu diminuir o IPI logo agora. Os carros todos caíram de preço do dia pra noite. A Giovana ficou pensando muito nisso nos últimos dias. Toda hora era uma piadinha: “que falta que esse IPI me faz? Ah! Se o meu IPI voltasse, dava para comprar umas coisinhas pra mim”. Não me lembro bem do que ela falou mais, mas eram coisas desse tipo. Nossa! Se a minha filha lesse meu diário ia adorar fazer uma aulinha do uso de “mais” e “mas” com esse exemplo. Parece que quanto mais espontânea a língua mais clara ela fica.

Este mês me traz muitas recordações ruins do ano passado. Acho que encarnei o meu lado Rita Lee e resolvi mudar e fazer o que eu quero fazer. Preciso começar a escrever o meu mundo interior os meus sonhos mais ocultos. Quero mergulhar na minha alma. Preciso esquecer um pouco a minha família e deixá-los ocultos nos meus escritos. Afinal, eu escrevo esse diário para mim.  Achei um companheiro ideal para mim. Tem um livro do Drummond aqui em casa que é cheio de frases dele sobre vários assuntos.

A primeira frase que mexeu comigo foi que “A ingratidão é o imposto cobrado à generosidade”. O ser humano é assim mesmo: ingrato em tudo na vida. Essa frase deveria estar em cartazes por todas as ruas para dizer que o mundo tem outro valor e outro foco do que é necessário para as relações das nossas vidas tenham sentido e fraternidade profunda. Isso é que deveria ser ensinado na escola. Usar a língua na vida real prática é muito mais importante do que viver a vida “normalmente” nessa perda de tempo e de interesse pelo ser humano.

A vida é, realmente, uma ingratidão à verdadeira generosidade.

sexta-feira, 17 de maio de 2019

Diário: 14 de maio de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven)


14 de maio de 2012.

Resolvi fazer de hoje o meu dia de verdade. Um dia de libertação dessa vida à toa. Dei a desculpa de que a inflação estava alta e disse que precisa andar pelos mercados para conferir como poderia economizar mais. Para mim, o Extra é sempre melhor, mas a minha família nem desconfia. Resolvi aprontar das minhas fugas. Saí com um caderninho, que ficou em branco até o fim do dia. De manhã eu resolvi andar pelo Parque da Cidade até mais ou menos onze e meia. Ele anda meio caído, mas ainda é encantador, ainda mais quando tá tudo verdinho e brilhante. Resolvi até beber uma água de coco para ver se conseguia relaxar melhor numa daquelas cadeiras de ferro de bar de esquina. O contato com a natureza é capaz de revigorar a alma. Essa natureza vale a pena, já as das minhas relações familiares não valem realmente nada.

Cheguei em casa e fiz o almoço bem simples, sob o pretexto de fazer mais uma caminhada. Inventei que os peixes do Carrefour do shopping aqui do final da Asa Norte tinha um bom preço para peixe e frango, mas que no resto das coisas não compensava muito. A minha família fez o de sempre: fingiu que ouvia, mas não prestou atenção em praticamente nada. Só o Henrique que me deu um beijo áspero e morno.

À tarde resolvi andar pelo Olhos d´ Água aqui no fim da Asa Norte. Entrei no mato virgem de mim mesma e aproveitei um pouco a mata e a pista. O sol estava forte, mas valeu a pena cada passo. Eu comprei um pão e joguei os pedaços para os peixes. Tão bonito ver os peixes todos juntos atrás de um pedaço de comida. É simplesmente maravilhoso viver assim, com liberdade de tudo. A segunda-feira nunca foi tão linda para mim.

Para terminar eu ainda passei no Extra e decretei o que era do meu costume: o Atacadão costuma ser mais barato, mas o Extra é bem mais prático e eu vou continuar indo ao Extra. Só passo nos mercadinhos aqui perto por serem ainda mais práticos no dia a dia da gente. Pena que essa aventura foi uma espécie de saidão que resultou na minha volta à prisão domiciliar.

sexta-feira, 10 de maio de 2019

Diário: 13 de maio de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven)


13 de maio de 2012.

Hoje parece que voltei no tempo. Tudo está como antes. Fomos ao Mangai e aproveitamos o “meu” dia da melhor forma possível para a minha família: sem eu cozinhar. Meu marido nem me ama mais, mas parece aficionado com a ideia das convenções sociais. Ganhei aqueles presentes de sempre: sabonete, perfume, vestido discreto e um par de brincos. A minha família é muito estranha, inclusive eu. Mas hoje, na fila do Mangai, eu reparei que a vida é um pouco mais igual do que eu imaginava. Olhei para as outras mulheres. Senhoras de 50 ou 60 anos reunidas com a família e perdidas em si mesmas. Embora separadas, estávamos unidas pela indiferença. Olhávamos para o nada, nossas famílias nos ignoravam e o mundo parecia um teatro de fantoches guiados por uma obrigação tosca e vazia.

Por que a vida tem desses becos sem saída para o coração humano? A gente tem alguma saída? Eu pensava em algo do tipo quando fui sugada pela minha vez na fila de pegar comida. Como seria uma vida diferente? Eu realmente queria ser amada de verdade. Não pelos meus filhos, família ou amigos, mas pela vida. Não quero saber da vida de jeito nenhum. Pelo menos não da vida que eu tenho.

sábado, 4 de maio de 2019

Diário: 2 de maio de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven para este blog)



2 de maio de 2012.

Às vezes a rotina suga a nossa alma e nossos sonhos. A rotina, muitas vezes, é o próprio inferno na Terra. Hoje lavei roupas, cozinhei, fui ao mercado e ajeitei a casa. Sinto-me exausta por completo. Mas venho escrever em sinal de resistência. Resistência a esse mundo sujo e mesquinho cheio de privilégios. Privilégio que eu carrego nas costas. Se não fosse eu, o que seria da minha família? Eles não dariam conta de fazer nada. E eu sem eles o que seria? Acho que eu teria asas para voar no infinito dos sonhos. Viajaria muito e sempre para onde eu quisesse sem olhar para o chão e pensar que vou lavá-lo. Eu nem olharia para o chão, pois estaria nas nuvens do paraíso da liberdade. Liberdade é o que eu sonho realizar um dia.... um dia.

Pelo menos eu desabafei um pouco no meu diário, mas hoje, definitivamente, eu perdi a batalha.

sexta-feira, 26 de abril de 2019

Diário: 1º de maio de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven exclusivamente para este blog)


1º de maio de 2012.

Voltei ao início do meu diário. Voltei a escrever um ano atrás. Pelo menos hoje foi feriado para a Giovana. Ela e meu filho fizeram o que eles chamam de “morgar”. Que expressão esquisita da minha família. Ficar falando esse tipo de bobagem para eles é uma espécie de libertação. Engraçado como as pessoas se libertam com qualquer coisa que vem na boca. Eles não mudaram em nada. Estão em trabalhos inúteis e fazendo muita brincadeira para se divertir. Eles têm um espírito de Peter Pan misturado com toques amorosos Malhação.

No fundo eu acho que tudo muda para não mudar nada. A minha relação mesmo com a minha família não tem nada de novo há muito tempo. Se tudo estivesse bem, que bom, mas agora as coisas andam numa mesmice tediosa aqui em casa. Pra ser sincera, só sinto emoção quando vou à padaria ultimamente. O coração tem desses rompantes platônicos.

Voltei a ler. Só que dessa vez reli o Carlos Drummond. Pena que não se escreve mais tão bem assim hoje em dia. Ele tem um poema que ele fala da pedra. Sim, uma pedra no meio do caminho toma conta do seu universo. Ele fica abstraído na pedra. A Giovana falou que ele falava esse tipo de coisa para criar muitos sentidos e chegou a dizer que era só uma pedra que ele viu e escreveu um poema que todo mundo adorou muito tempo depois que só falou depois. Na época ela foi tratado como um maluco. Eu queria ser uma maluca inteligente assim.

Se bem que a loucura é uma coisa boa às vezes.

sábado, 20 de abril de 2019

Poema A Saudade




A Saudade

Por onde anda você,
Que não vejo mais,
Que tanta falta faz?

No frio do inverno,
Queria te aquecer;
No calor da primavera,
Te ver florescer.

Quem me dera
Reviver as nossas estações,
Mas já não posso mais...
Será que a gente... nunca mais?

O tempo e a eternidade
Têm a exata resposta,
Mas preferem me deixar...
Simplesmente...  a saudade.
(Fernando Fidelix Nunes)

Vídeo de apresentação do canal apenacapital

Aproveitem nosso primeiro vídeo!



quinta-feira, 18 de abril de 2019

Diário: 30 de abril de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven exclusivamente para este blog)

30 de abril de 2012.

O Henrique resolveu devolver os dez mil reais para a Giovana. Ele disse que não ia mais precisar do dinheiro mais não. Agora como pode o Henrique dizer que não precisa mais de dez mil reais de uma hora para outra? Isso é muito estranho. Ele disse que deu um jeito e recebeu um dinheiro antigo do governo. Se eu pudesse ver a conta bancária dele, eu até conseguiria relaxar um pouco com isso para saber o que acontece. O ruim de não ter poder é não ser capaz de resolver as coisas da própria vida e de entender tudo que nos envolve. A censura silenciadora é mais forte do que qualquer massacre sanguinário da História humana. Se bem que eu nunca passei por nenhum dessas tragédias que são tema de aulas de história para contar.

A Giovana já começou a pesquisar um carro usado. Já achou um Peugeot, acho que se escreve assim. Eu fico meio assim com esses carros porque sempre são mais caros na hora da revisão, mas qualquer coisa o Henrique mesmo paga. Depois desse incidente, o Henrique deu uma olhada no Extra aqui de uma renovação aqui em casa para valer dessa vez. O governo diminuiu o imposto sobre o que os jornalistas todos pomposos chamam de linha branca. Eu chamo linha da escravidão feminina. Nossa! Como eu estou ácida hoje, mas no fundo acho que gosto disso.

Hoje tentei voltar a escrever num caderno. Abri o caderno, escrevi pouco mais de uma página e parei no início da segunda folha. Acho que não me sinto mais à vontade para escrever à mão. Tem duas coisas: eu acho que escrevo melhor no teclado do computador daqui de casa do que com a caneta. Outra coisa é o medo. Tenho medo de a minha felicidade clandestina ser descoberta pela minha família. Há coisas que precisam ficar em segredo na vida, o meu diário é uma delas. Peguei as folhas, rasguei-as e botei tudo no lixo. Voltei a escrever agora só. Ainda bem que aqui ninguém olha o lixo além de mim.

Hoje eu vi de longe o homem que veio falar comigo na padaria. Eu estava indo para o comércio e ele estava com um saco de pão na mão. Eram umas cinco da tarde. Acho que ele vai na padaria nesse horário normalmente. Talvez eu ande pela padaria nesse horário outro dia. 

sexta-feira, 12 de abril de 2019

Diário: 19 de abril de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven para este blog)

19 de abril de 2012.

Semana passada foi realmente uma sexta-feira 13! A Giovana sofreu um acidente na rua. Um acidente não, um susto. Ela foi atropelada enquanto atravessava a faixa de pedestre. Eu não quis perguntar para não constranger ninguém, mas tenho certeza de que ela nem deu o sinal para atravessar a faixa. Por sorte, o carro freou a tempo e o motorista ainda a socorreu. Parece que ele estava até querendo pegar o telefone da Giovana, mas o Henrique não deu espaço e tomou conta da filha.

Depois de ir no hospital, as coisas voltaram ao normal aqui em casa. Ao normal por completo. A Giovana voltou a falar com o Henrique na maior paz. Até parece que nem brigaram por nada. A Giovana também foi hoje na Secretaria de Educação e conseguiu uma vaga como professora temporária no colégio na Asa Sul. Ela foi do Inferno ao Céu. Vai começar na semana que vem, assim que a papelada ficar pronta. Ela não vai ganhar muito, mas será o suficiente para ela ocupar a cabeça e não ocupar a vida dos outros tanto. Se bem que, pelo que ela falou, talvez ela até leve o almoço para o colégio.

Às vezes as coisas acontecem de forma bem esquisita na vida das pessoas. Quando a gente menos espera vem uma onda e nos surpreende. Hoje mesmo, na padaria um homem puxou conversa comigo. Ele fez umas 2 piadas na fila e falou mal do PT. Eu gostei e ele se despediu com uma cara que queria dizer “seria bom te ver de novo”. Às vezes eu também só queria dar um fugidinha.

Acho que terei muitas emoções daqui pra frente.


(Esta é uma ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

quinta-feira, 4 de abril de 2019

Diário: 13 de abril de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven)

13 de abril de 2012.

Eu quase excluí o meu diário. Sei que jamais serei lida por alguém da minha família. Na verdade, eu espero nem ser lida por ninguém além de mim. A vida é um parque de diversões muito sem graça para a gente não ir no brinquedo predileto. Às vezes acho que o diário é a melhor coisa que eu tenho. Mas tenho tanto medo de ser lida. O que nós escrevemos para a gente não pode ser esquecido assim. Afinal, as palavras são mais perenes que o espírito.

Hoje foi uma sexta-feira 13 muito complicada aqui em casa. O Henrique e a Giovana discutiram feio de manhã e ela ainda não voltou para casa. Eles ficam discutindo por qualquer coisa. Perguntei para o Henrique o que aconteceu e ele só falou: “não foi nada! Não enche!”. Dizer isso é tão ruim quanto levar um tapa.

O Daniel vai ficar com a Rayane no fim de semana e nem tá sabendo de nada. Ele e a namorada andaram se estranhando numa conversa por telefone, mas logo fizeram as pazes de uma hora para outra. Reconciliação é uma coisa sempre boa quando queremos melhorar. Do contrário, é só para prolongar uma conveniência da vida, e de conveniências baratas o mundo está cheio. A vida bem que podia aprontar alguma coisa para me animar um pouco.

(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 29 de março de 2019

Diário: 25 de março de 2012




25 de março de 2012.

Hoje eu tive um sonho bem esquisito. Dizem que os sonhos revelam muito sobre a nossa mente inconsciente. Eu nunca li nada sobre isso. É desses assuntos que as pessoas falam, mas não resolvem nada, só serve para encher linguiça na televisão durante 2 minutos. Aí o povo é desinformado e ninguém sabe o porquê. Todo mundo sonha o tempo todo. Nunca vi o Globo Repórter ou qualquer canal da televisão falando dos sonhos. Parece que o que interessa é detalhe. A televisão fica perdendo tempo com bobagem sem se importar com o que interessa.

Eu fico enrolando porque só posso desabafar aqui mesmo. Bem... meu sonho foi bem esquisito. Nunca imaginei que algo poderia marcar tanto o meu coração. No meu sonho, eu acabei imaginando a minha família toda reunida nos bancos vazios na frente do bloco. A gente fazia um churrasco com carne boa e uma mesinha com uns pratos. Todos estavam felizes: a Giovana estava rindo e me ajudando com tudo, o Henrique ria e me abraçava com carinho e a Rayane e o Daniel se abraçavam perdidamente apaixonados e indiferentes ao mundo ao seu redor. De repente, vinha um furacão e acabava com tudo.

Nessa hora do furacão, eu acordei. Tanto quanto o sonho, o que me chocou foi a reação do Henrique. Ele não teve reação nenhuma. Nenhuma reação. O silêncio dele nesse momento foi a pior coisa que ele já me disse. As pessoas acham que só se comunicam falando. Eu acho diferente. As pessoas se comunicam bastante no silêncio. Um olhar ou uma ação indiferente é a pior coisa que a vida pode oferecer à vida em se tratando de comunicação. Isso realmente me modificou.

O que eu fiz da minha vida? Como eu posso sair desse buraco de vida? Como me libertar dessa rotina maldita? Como a vida pode valer a pena de novo? Como posso reencontrar o amor da e na minha vida? Quero respostas, mas só encontro perguntas.

sábado, 23 de março de 2019

Diário: 12 de março de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven exclusivamente para este blog)


12 de março de 2012.

Hoje escrevo só para manter o hábito. O hábito de escrever é o hábito de viver por natureza. Acho que é o momento em que me sinto viva e não uma máquina... uma máquina de lavar, passar, cozinhar, cuidar, limpar... uma máquina da vida e para a vida. Ser uma máquina tem a vantagem de massagear a dor inexistente. A dor passa a ser um detalhe a ser ignorado. A vida não é nada fácil.

O Henrique deve estar ainda muito próximo da Tereza. Esse negócio de celular pré-pago é muito ruim. Antes a gente sabia todos os telefones que tinham ligado para o telefone da casa, que é de todo mundo. Daí dava para ver quem ligou e por quanto tempo falou. E isso era feito de forma discreta. Fico imaginando quantas traições foram descobertas assim.

Agora, com o celular pré-pago, cada um fica cuidando da sua vida. Isso é bom para as pessoas fazerem coisa errada. Dizem que a tecnologia só serviu para ajudar as pessoas a serem melhores. Mentira. A tecnologia é a maior arma para os vícios e mistérios obscuros do ser humano. A vida é assim, bastante sem sentido.

Meu filho é a única pessoa que segue um caminho na estrada da vida. Só que a vida é longa e cheio de barrancos. No fundo eu tenho medo de que ele faça com a Rayane a mesma coisa que o Henrique fez comigo. Mas é difícil, pois ele, mesmo melhorando muito, é incapaz de conseguir o emprego do Henrique e comprar um apartamento na Asa Norte. A vida é assim, bastante complicada.


(Esta é uma ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

quinta-feira, 14 de março de 2019

Diário: 11 de março de 2012

(Ilustração feita magistralmente por Enthony Keven)

11 de março de 2012.

Hoje acordei com vontade de escrever. Passei o dia todo ansiosa para escrever agora à noite, mas me vi sem quase nenhuma inspiração. Se eu tivesse escrito de manhã, acho que conseguiria inundar este dia de poesia e força, só que a vida não é fácil. Tive que fazer faxina, cozinhar e ainda fazer as compras do mês no Extra. Foi um redemoinho que sugou as minhas energias por completo. Agora, de frente para a tela, poucas ideias vêm à minha cabeça.

Eu acho que me sentia mais à vontade quando eu escrevia usando uma caneta em vez de um teclado. O teclado é uma ferramenta absolutamente fria. O som da chuva também me motiva a ficar desanimada. O som da chuva é como as marteladas que a rotina deu nos pregos que me prendem para que eu não desabe nem voe por aí. Tem tanta gente dizendo por aí que tudo depende da gente, mas eu não acho isso. Acho que não fazemos as coisas por nós mesmas sempre para melhorar. Precisamos de outra pessoa. De outra pessoa não, de muitas outras. Se alguém quiser me matar na rua, não depende só de mim.

Nossa! Que pensamentos esquisitos ficam passando pela minha cabeça ultimamente. Às vezes eu sinto inveja dos mendigos que dormem nos bancos e no comércio aqui da quadra. Eles podem andar para qualquer lugar que eles quiserem. Mas eles passam fome! O que eu tô escrevendo? Não consigo entender direito de onde tirei esses pensamentos.

A minha família hoje, significa apenas a ocupação dos espaços na minha vida. Queria ver meu coração ocupado por uma vida plena, mas as coisas não são assim. Na verdade, eu nem sei como as coisas são de verdade. Vai entender como a vida é. As coisas serão muito complicadas se eu continuar assim. Na verdade, acho difícil as coisas piorarem. E ainda tem gente que coloca o dia da mulher como uma grande coisa. Eu nem gosto de falar sobre ele, pois, para mim, é só uma maneira hipócrita da sociedade falar que as mulheres são homenageadas para no dia seguinte pisar nelas. Tenho até o que falar sobre a minha família, mas deixo isso para depois porque estou muito cansada.

(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)


sexta-feira, 8 de março de 2019

Diário: 10 de março de 2012

(Ilustração feita com maestria por Enthony Keven)


10 de março de 2012.

Não ando muito inspirada para escrever. O dia a dia nos deixa para baixo. Os desafios não são problema para a vida das pessoas. O problema é a rotina. É ela que nos afoga num oceano de tarefas que se encerram ao final do dia. Lavar, passar, cozinhar, limpar e comprar são coisas que tomam conta do meu tempo. Só consigo relaxar assistindo televisão. Só vem notícia ruim desses políticos vagabundos de Brasília. Ainda bem que tem muitos filmes e novelas para distrair um pouco.

Agora como eu posso sair desse labirinto da rotina? Como tirar a dor que eu carrego dentro de mim. Resolvi ler um livro do Drummond da estante da minha filha. O livro está novinho, parece até que nunca foi lido por ninguém. Na verdade, eu duvido muito que a Giovana tenha lido esse livro, esse e muitos outros livros que ela tem só de enfeite na estante. Enfim, ele fala uma coisa muito inteligente. Ele diz no poema “Consolo na Praia” que várias coisas passam pela nossa vida, mas sempre tem algo que vale a pena e que fica em nossos corações. Ele diz que os amores passam, mas o coração continua.

Eu hoje vejo a vida de um jeito diferente. O coração continua angustiado. O Drummond era inteligente, pois não falava muito sobre o ambiente nesse poema ou nas características dos elementos. A vida é assim mesmo: as pessoas tentam esconder a verdade para machucar menos. O ser humano com um bom coração costuma ter medo ou vergonha de machucar outras pessoas. Pena que as pessoas olham apenas para as grandes dores e se esquecem das cotidianas. Hoje nem falei da minha família direito. Só falei de mim mesma. Foi melhor assim.

sexta-feira, 1 de março de 2019

O País do Carnaval

(Ilustração feita por Enthony Keven)




O País do Carnaval


O problema do ser humano não são os seus sonhos, mas os seus desejos. Essa ideia não sai da minha cabeça já faz algum tempo. Quando eu estou no trânsito, na sala de aula ou até mesmo na academia, essa ideia me assalta o pensamento. Tenho acreditado que os sonhos das pessoas são belos, idealizados e agregadores de transformações positivas, tal como um poema romântico da primeira parte de Lira dos Vinte Anos ou crítico como o Navio Negreiro. Já os desejos são egoístas, despreocupados e inconsequentes, como a sordidez de Brás Cubas e a canalhice de Bentinho. Ainda vou achar uma explicação mais completa para isso. Afinal, a vida é longa e não precisamos de pressa para resolver os enigmas da Esfinge, já que podemos controlar a angústia de sermos controlados por uma dúvida. Sim, podemos controlar nossas angústias mais agudas, basta aprendermos como. Por enquanto, falaremos de outras coisas ou dessa mesma ideia com as suas consequências.

O Brasil está uma vergonha lastimável. Boa parte dos meus alunos é capaz de falar 10 minutos sobre uma obra literária, mesmo que não tenham lido o livro. O presidente brasileiro não foi capaz de fazer um discurso detalhado sobre o que fará para o Brasil ser um país melhor. Objetividade é algo que se deve procurar em textos formais, mas não é desculpa para uma argumentação rasa. Hoje, mais do que nunca, precisamos ser específicos para resolver o Brasil, pois o Brasil não se resolverá sozinho e ao acaso. O Enem cobra isso na redação por meio da competência 5: a elaboração de uma proposta de intervenção. O presidente que já se gabou de que tiraria uma nota melhor que outros políticos no Enem, dificilmente tiraria uma nota decente nessa competência. O problema é que nós vamos sendo puxados pelo bloco que ele comanda: Unidos da Estupidez – cuja bandeira é laranja.

Agora uma coisa precisa ser dita: um homem capaz de trocar mensagens com seu ex-ministro pelo WhatsApp e dizer que não falou com um dos seus homens de confiança é, definitivamente, capaz de qualquer atrocidade. Como pode o indivíduo cair numa dessas. Acho que é um vazamento recorde para um presidente brasileiro. Se bem que ele deve receber apoio recíproco durante um tempo para conseguir reformar a Previdência Social. Depois disso, só Deus sabe o que pode acontecer com o Brasil.

E o MEC? É inominável o que esse ministério faz. Procurei no Aurélio e em dois dicionários de sinônimos e não achei um termo sequer capaz de descrever as atitudes do MEC. O colombiano resolveu mandar um e-mail ridículo falando do hino nacional e pedindo a veiculação do slogan do governo. Além do slogan ser uma coisa de lunático religioso que não lê a Bíblia, o povo acha que a revolta é por conta do hino nacional. Não! A revolta é pelo slogan e é dupla porque os alunos não sabem o que significa o hino nacional. Há centenas de milhões de brasileiros que não sabem o que significa metade do seu próprio hino, tão exaltado em Copas do Mundo e, às vezes, tocado nas Olimpíadas. Nem o pessoal da página “Cenas Lamentáveis” seria capaz de postar tantas atrocidades.

No futebol, nem parece que somos a sede da Copa América. O brasileiro anda com vergonha da sua seleção como de um escândalo familiar que precisa ser ocultado a qualquer custo. E ainda por cima temos um monte de estádios caríssimos que estão servindo de casa para formigas de todo tipo. A CBF, nesse quesito, é mais cretina que qualquer político brasileiro. Queremos que muita coisa mude neste país, mas parece que nada vai mudar. De fato, a indiferença e a estupidez são os principais alicerces do subdesenvolvimento brasileiro.

Como os seres humanos estão correndo loucamente para o abismo, vamos rezar para o Céu, pois na nossa terra as coisas estão complicadas.

(Fernando Fidelix Nunes)

Diário: 1º de março de 2012

(Ilustração feita por Enthony Keven para este blog)

1º de março de 2012.

Quanta coisa para um mês só. Impressionante como a vida é cheia de reviravoltas. Fiquei um bom tempo sem escrever mais por dificuldade em digerir os fatos do que por conta da ausência de fatos. Foi uma loucura esses dias. Tem coisa que acontece na vida real que parece mentira, mas acontece mesmo.

Depois de tanta confusão, a Giovana passou o Carnaval com o namorado argentino dela. Ele tem um jeito de malandro latino que nunca ia me enganar, mas enganou a minha amada filha. Ela ficou com ele na casa da dona Aurora até o último dia de Carnaval. Na noite de terça-feira acabou o carnaval e o namoro da minha filha. Ela pegou o namorado argentino beijando outra mulher enquanto ela estava no banheiro. Ele tentou se justificar e tudo mais. Foi um barraco que terminou com as coisas dele na rua em frente à casa da dona Aurora. Foi um barraco memorável. A Giovana quis ficar lá nos dias seguintes. Como ela ainda não conseguiu ficar numa escola fixa, ela preferiu ficar lá para diminuir a vergonha, que foi gigantesca. A gente ficou sabendo pela fofoqueira da dona Aurora. Mas nesse caso era realmente difícil esconder.

O Daniel e a Rayane curtiram bem o mês. As aulas deles voltaram, mas o amor deve continuar. Tomara, porque meu marido comigo anda péssimo. Não faz nada além de trabalhar, mais nada além disso! Ele deu um sorrisinho sórdido quando ficou sabendo da história da Giovana. É aquela coisa de pai que diz “eu avisei, sua boba” sem dizer uma única palavra. No fim das contas, eu acho que às vezes usamos nossos filhos para apontar os erros que cometem só para nos colocar acima deles. Talvez seja isso.


As coisas devem voltar a melhorar aqui em casa. Pelo menos devem andar melhores do que este país, que parece se perder cada vez mais. Muita coisa complicada nos aguarda, muita coisa. Ando com uma saudade do Fernando Pessoa.

(Esta é uma obra de ficção criada por Fernando Fidelix Nunes)

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Proposta de Redação: O Desafio de se combater trotes violentos nas universidades brasileiras

(Ilustração feita por Enthony Keven para este blog)

Vamos escrever!

Mais uma proposta de redação no formato do Enem para vocês!


Com base na leitura dos textos motivadores a seguir e nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija texto dissertativo-argumentativo em norma padrão da língua portuguesa sobre o tema O DESAFIO DE SE COMBATER TROTES VIOLENTOS NAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS, apresentando proposta de intervenção social que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista. 

As três primeiras redações serão corrigidas GRATUITAMENTE nos comentários do blog.

Textos Motivadores:




sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Diário: 9 de fevereiro de 2012

(Ilustração feita por Enthony Kevin Vieira)



9 de fevereiro de 2012.


O Carnaval já está chegando e a vida já começou a aprontar das suas por aqui. A Giovana perdeu a batalha do carro, mas venceu a guerra, porque o namorado argentino virá para Brasília e terá onde ficar. A casa da dona Aurora será o refúgio do amado da minha amada filha. Impressionante como a vida se parece com uma sequência de novela mexicana às vezes.

A minha filha anda mais feliz com as peripécias que a vida lhe reservou do dia para noite. Na verdade eu não acho que foi do dia para a noite, mas foi aos poucos. Agora eu reparei que ela foi na casa da dona Aurora umas cinco vezes com o pretexto de encontrar o William que quer ser chamado de Alana. Ela ficou falando que queria ler e falar com ele sobre poesia, principalmente a poesia dele. Ela disse que ele tem um dom. Artista bom costuma ter um parafuso a menos na cabeça.

Acho que é por isso que eu nunca vou ser escritora. Escritores têm a cabeça em outro mundo. Eu sou presa na e pela rotina cotidiana. Às vezes eu fujo para o meu diário, mas a minha vida é como os bancos vazios. Estão sempre lá com tudo pronto para ser útil, mas só serve para enfeitar a paisagem. Nem os mendigos dormem nos bancos. Se vierem deitar nos bancos, é capaz de quererem levar embora o povo falando que estão atrapalhando.

É impressionante a indiferença das pessoas com a miséria. As pessoas falam da miséria fingindo que têm pena dos mendigos, mas na verdade nem ligam pra ninguém. A vida é assim mesmo.

(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes exclusivamente para este blog)

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Diário: 6 de fevereiro de 2012

(Ilustração feita magistralmente por Enthony Kevin para este blog)


6 de fevereiro de 2012.


Hoje foi uma segunda-feira de rotina. A rotina começa a voltar ao comum. A Giovana está se virando para pegar um trabalho como professora temporária para o governo. Ela até diz que quer estudar para concurso, mas ela não lê nada. Então, ela nunca vai ler nada se continuar desse jeito e vai viver como professora temporária. O Henrique está voltando à sua rotina de trabalho e o Daniel também. Já eu, a minha rotina é a mesma sempre e sempre.

Mas, no meio da rotina, há espaço para redescobrir o mundo. O mundo não, a rua. A rua não, a calçada. A calçada hoje à noite estava linda. Ainda bem que eu consegui uma desculpa para poder ir até a padaria aqui do lado. Eu desci e admirei as luzes do crepúsculo misturadas com as luzes dos postes atrás do posto de gasolina daqui da quadra. Às vezes Deus pinta a paisagem como uma obra-prima com cores que duram frações de horas e expiram só deixando rastros no âmago de nossa alma. Até os bancos vazios da quadra ganharam uma vida nova para mim. Uma vida que será eterna enquanto durar a paz em meu coração.

Os problemas da Giovana não pesaram em minha cabeça enquanto eu caminhava. Os defeitos da fraqueza do Daniel, que só se salvou por conta da Rayane, eram paisagem de outra era. E o Henrique e seus mistérios toscos sumiram da minha mente. Falei com uma alegria radiante com o rapaz da padaria. Ele estava visivelmente chateado. Afinal, trabalhar até dez horas da noite e ainda pegar um ônibus para a periferia não deve ser nada fácil. Mas confesso que fui indiferente a isso. Quando estamos felizes, olhamos só o lado bom das coisas e diminuímos a angústia da vida como um todo.

Com ou sem rotina, a vida continua com uma intensidade cada vez maior com o tempo. Agora, os nossos caminhos são um mistério. Não gostei desse último parágrafo. Acho que é o sono. É melhor ir dormir.




(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Diário: 4 de fevereiro de 2012

(Ilustração feita por Enthony Vieira para este blog)


4 de fevereiro de 2012.

Hoje foi um sábado de ressaca. Todos resolveram sair ontem à noite. Minha filha saiu com as amigas e voltou bêbada. Meu filho ficou com a Rayane na festa até de madrugada e veio deitar com ela quando o sol já tinha nascido. O Henrique chegou fedendo muito. Cheiro de bebida é nojento. É pior ainda quando o cheiro é de cachaça. Ser acordada no meio da madrugada com bafo de cachaça é nojento.

Eu deveria ter aproveitado o dia de ontem para escrever um pouco. Estava sozinha em casa sem ninguém para atrapalhar a minha escrita clandestina. Mas não escrevi. Preferi sentir pena de mim mesma e olhar o vazio ao meu redor com melancolia e rancor. Todos escolheram sair sem mim. Eu não sou uma parceira para fazer as coisas boas. Acho que para a minha família eu devo ser apenas uma dona de casa qualquer. Nem dona eu sou porque não ando mandando em nada.

A melancolia do vazio é uma janela para o infinito do pessimismo. Lembro que já tive momentos em que eu consegui ver as coisas de uma maneira mais positiva. Foi um dia em que as coisas fizeram sentido para mim. Hoje não. Ontem eu fiquei afundada no sofá com a tristeza no meu coração me tomando por todos os lados.

De manhã a ressaca foi de todos. Se está assim agora, imagina no Carnaval? Será que as coisas mudam? Não sei. Na vida dos outros talvez. Na minha nada mudará. Talvez um pouco mais de leitura sirva de alento para o meu coração. Afinal, a vida nesta cidade anda um deserto até quando chove.


(Esta é uma obra de ficção criada por Fernando Fidelix Nunes)