quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Diário: 1º de fevereiro de 2012

(Ilustração feita por Leonardo B. Ferrreira, exclusivamente para este blog)

1º de fevereiro de 2012.
               
O que está acontecendo com a minha família ultimamente? Tem uma música que diz que o caminho só existe quando você passa. Depois eu vou procurar o nome da música para saber. Mas eu ando com essa frase muito intensa na minha cabeça. Minha família parece que percorreu o caminho do fracasso com uma genuína presteza. Nossa! Ler Fernando Pessoa ajuda de verdade a escrever melhor.

Ontem o Henrique vendeu o Uno da Giovana por dez mil reais. A Giovana bem que tentou atrapalhar a venda, mas não deu conta. O carrinho da minha filha é bem fácil de vender. As pessoas olham para ele e ficam loucas. Dizem que é mais econômico que os outros e o povo cresce o olho para tomar para si aquela máquina de economia de combustível. Quando o Henrique foi mostrar o carro, ele não conseguia achar a chave. Pediu para eu falar com a Giovana, que se negou a entregar a chave. Falei com o Henrique e ele disse que ia ter uma conversa séria com a Giovana e que não ia ser interrompido. Ele foi em direção ao quarto da Giovana e disse que ia resolver isso a sós com ele.

Eles ficaram no quarto durante 10 minutos. Ele saiu com as chaves do carro nas mãos e fazendo segredo do que disse. O Henrique recebeu em dinheiro, mas logo levou ao banco o dinheiro, para não correr riscos. Não faço ideia do que o meu marido fez para precisar desse dinheiro todo de uma só vez. Sem carro, as coisas vão ficar um pouco mais complicadas aqui em casa. A Giovana diz que dá um jeito e o Daniel anda com a Rayane sempre e ela tem o carrinho dela também para esse tipo de coisa.


Parece que este ano vai ser cheio de confusão para mim. Já estou ficando com saudades dos problemas de 2011.

(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Diário: 26 de janeiro de 2012

(Ilustração feita pelo talentoso Enthony Vieira para este blog)


26 de janeiro de 2012.

Eu vi muita coisa estranha nesta semana, mas o que mais me chamou a atenção foi escrever no computador. Esse programa Word é meio confuso de mexer no início, mas a gente se acostuma nos mínimos detalhes com ele. O que eu mais gosto nele é que ele sempre destaca um erro de português nosso. A Giovana me disse que devemos falar “ortográfico”. Não sei por que ela sempre escolhe um jeito difícil de falar o que todo mundo entende. Parece que todo mundo usa esse programa. Por isso que o criador dele é uma das pessoas mais ricas do mundo. Realmente, não tem como uma pessoa trabalhar para tanta gente e ficar pobre.

Acho que enrolei mais por estar indisposta com minha família do que por falta de capacidade. A Giovana ficou chocada quando soube por mim que o Henrique vai vender o carro dela. Sim, o Henrique resolveu vender o carro da Giovana, que o Daniel também usava de vez em quando para sair com a Rayane. Eu não consigo entender direito isso. Como pode o meu marido ter uma atitude dessas? Ele está inventando que precisa de dez mil e vai vender o Uno dela por dez mil reais. Botou no jornal e colou um papel no vidro do carro para fazer a propaganda. Eu mesma tentei falar com ele, mas foi em vão. Colocar a Giovana numa situação dessa do dia pra noite por conta de uma discussão besta é demais.

É isso que eu mais odeio no Henrique. Ele acha que, por ele ser o dono do dinheiro, ele manda em tudo sem pedir a autorização de ninguém que fica tudo bem. A Giovana até precisa de limite, mas vem querer dar agora que ela já tá uma mulher feita? Isso é péssimo! Ele vai fazer uma grande besteira vendendo esse carro. O Daniel ficou com a Rayane e não está sabendo ainda. Na verdade, eu nem sei como vou falar isso pra ele. “Bom dia, meu filho. Seu pai vai vender o seu carro porque precisa de dez mil reais”. Péssimo, simplesmente péssimo.

Acho que isso é a pior coisa que eu vejo no meu país. Não falo de vender o carro por si só. Se os problemas entre país e filhos tivessem como limite a venda de carros, o mundo seria um paraíso. Não. Eu acho que quem tem poder costuma sempre olhar pra ele na hora da crise e achar nele uma maneira de se vingar de quem desagrada. O Henrique quer mostrar que é dono do mundo quando não tem mais controle de nada. Péssimo, simplesmente péssimo.



quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Diário: 18 de janeiro de 2012

(Ilustração feita por Leonardo B. Ferreira exclusivamente para este blog)


18 de janeiro de 2012.


Como as coisas conseguem piorar em uma semana. Depois que o Henrique voltou, já de madrugada, eu tentei falar com ele que a gente não resolvia as coisas assim na nossa família. Ele não quis conversa e disse "não quero falar agora, Márcia". E foi deitar.

Nos últimos dias tem sido muito difícil para mim aqui em casa. O Henrique e a Giovana mal se falam. Na verdade eles nem se falam. O Henrique agiu como uma criança de dez anos e, ao ver a Giovana e eu no sofá da sala, simplesmente disse “tchau, Márcia”. A Giovana fingiu que estava tudo bem e continuou assistindo ao jornal na televisão.  É como se eles estivessem numa queda de braço para ver quem vai dar o braço a torcer primeiro. A Giovana até falou no celular depois com uma amiga um pouco do assunto e disse que macho nenhum vai mandar nas opiniões dela ou no corpo dela. Nem mesmo o próprio pai. Ela ainda falou umas coisas com a palavra patriarcado no meio que eu não entendi direito. 

O Henrique veio aqui hoje com uma conversa bem estranha de que anda precisando de dinheiro para pagar umas dívidas com urgência. Eu fiquei me perguntando: de onde saiu essa dívida? Na verdade, eu não guardei essa pergunta só para mim, eu a fiz diretamente. Ele só disse que eu não sabia como andam as contas e que o salário não anda dando para cuidar de todas as coisas aqui de casa. Agora eu não entendi, porque a gente não viaja nem nada. Não lembro nem do último crediário que a gente fez. Ele falou que tinha que arrumar um jeito de conseguir dez mil reais para ajeitar as coisas do jeito certo. Não sei de onde vem isso, só se a mesada do Daniel aumentou em dois mil reais e eu não fiquei sabendo direito. Isso é muito estranho mesmo.

Resolvi ler de novo o Livro do Desassossego para ver se me animo de novo ou pelo menos encontro mais ânimo na melancolia. No trecho 411 do Fernando Pessoa, ele faz uma excelente reflexão sobre a relação entre vaidade e orgulho. De cara ele diz: “O orgulho é a certeza emotiva da grandeza própria”. Embora o resto tenha valor, eu fico presa a essa frase, pois acho que a minha família tem uma certeza da grandeza própria estando muito longe dela. E isso é uma coisa de Brasília mesmo. No interior, as pessoas idiotas sabem que são imbecis e tentam dar golpes estranhos. Em Brasília, deve ser por conta do poder da cidade, as pessoas têm absoluta convicção de que são muito mais do que realmente são. Triste saber que as coisas são como elas são.



(Esta é uma obra de ficção criada por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Diário: 11 de janeiro de 2012

(Ilustração feita por Enthony Vieira exclusivamente para este blog)

11 de janeiro de 2012.

No fundo eu até achava que não ia acabar dando em nada a briga do Henrique com a Giovana, mas as coisas pioraram. As coisas aqui em casa começaram a ficar por um fio na vida de cada um por qualquer comentário. O Henrique e a Giovana começaram a discutir sobre o William. Quando a Giovana ouviu o Henrique chamar o William de William em vez de Alana, começou uma confusão. Eles começaram a gritar um com outro como nunca tinha visto. Eu acho que foi uma briga acumulada. É como se os dois estivessem dispostos a se diminuir até a última palavra. Tentei impedir, mas foi em vão. Eles ficaram batendo boca no pior nível possível por quase uma hora.

Eles relembraram os mínimos detalhes de cada um. O Henrique jogou na cara da Giovana que quem sustenta a casa e ela é ele enquanto a sua filha acorda tarde e não estuda direito para concurso por pura preguiça e burrice. A Giovana falou que ele age igual a um tirano sem qualquer consideração pelas pessoas da casa e da família a ponto de até querer ser dono da boc... do corpo dela. Ele rebateu dizendo que queria só respeito na casa dele em vez de sem vergonhice com um gringo que foi o primeiro idiota que ela tinha arrumado na rua. Depois dessa a Giovana se trancou no quarto e o Henrique disse que ia dar uma volta para ver se ia se acalmar.  

Depois de um monte de gritos que todo mundo disposto poderia ouvir, fez-se um silêncio completo aqui em casa. Não aquele silêncio de calmaria, mas aquele silêncio angustiante que cala as mais profundas dores da alma. Até tentei melhorar as coisas, mas não fui capaz de evitar essa confusão. Depois de tudo isso, resolvi que poderia ser bom ler o Fernando Pessoa e eu estava certa. Não sei se já tinha lido o trecho 313 em que ele diz “irrita-me a felicidade de todos esses homens que não sabem que são infelizes. A sua vida humana é cheia de tudo quanto constituiria uma série de angústias para uma sensibilidade verdadeira”. É verdade isso. As pessoas pensam que são felizes, mas na verdade não passam e vegetais infelizes na maioria das vezes.

Espero que essa melancolia vá embora da minha casa. Só que até agora o Henrique não voltou e a Giovana não saiu do quarto dela e eu aqui sozinha em casa. Assim fica difícil ficar bem.


(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Apresentamos o livro 30 Poemas Capitais

30 Poemas Capitais por [Fidelix Nunes, Fernando, passos de barros, renato]



Gente, começamos o ano bem! É com imensa alegria que nós anunciamos o lançamento do primeiro livro do movimento A Pena Capital: 30 Poemas Capitais. Trata-se de uma antologia de poemas de Fernando Fidelix Nunes e Renato Rocha disponibilizada, primeiramente, em formato digital. O critério de escolha dos poemas do livro de estreia do movimento foi o da qualidade, ou seja, aquilo que consideramos o melhor da nossa produção poética até o momento. Os poemas, constituídos a partir de diversas técnicas estilísticas, retratam de forma singular alguns dos temas mais críticos desta década sem fugir de temas universais, como: o caos político e social (“política entre amigos”, “a pele das cidades” e “2018”), o abandono infantil (“Onde Andam os Pais?”), a desilusão amorosa (“amor trifásico” e “Primavera”) e a aguda crise existencial (“A Busca”, “joão caminha”, “Líquido Moderno”, “fotofobia” e “o equilibrista”). Sem dúvida, o melhor livro de poesia lançado desde o início do ano em Brasília =). Boa parte dos poemas já estão publicados neste blog e podem ser lidos à vontade na seção "poemas".
O nosso ebook está disponível no site da Amazon e pode ser adquirido no seguinte link: