sexta-feira, 27 de abril de 2018

Diário: 9 de julho de 2011



9 de julho de 2011.

Hoje o ipê da felicidade estranhamente floresceu em mim mais uma vez. Henrique, Tereza, Giovana, Daniel, sogra, faxina, cozinha... tudo foi para o inferno e eu fiquei no paraíso da felicidade. Eu até desci para caminhar um pouco. Como a 307 estava bonita! Caminhei pelo gramado que fica na frente do posto de gasolina. Nossa, apesar do frio, eu senti a vida em cada instante enquanto eu caminhava. Aproveitei para andar na entrequadra entre as árvores. Foi muito bom mesmo. Vi os cachorros correndo todo felizes e aproveitei para fazer um carinho neles. Pensei como seria bom ter um cachorro aqui em casa. Foi bom que os cachorros retribuíram um carinho meu sem pedir nada em troca. Também fiquei conversando na rua. Depois de me libertar, resolvi comer uma casquinha aqui no Mc Donald’s. Nossa! Como eu fiquei feliz com uma casquinha. Eu parecia uma criança que tinha ganhado o Mc Lanche Feliz.

Comecei a ver a até a minha história com outros olhos. Sabe... o futuro e o passado ganharam cores que eu não lhes atribuía. As pessoas costumam pensar que vivem só um passado. Elas estão erradas! Nós vivemos diferente os nossos passados de acordo com a nossa cabeça. O fato de eu ter brigado com a minha irmã mais nova, a Maria, por uma boneca até ela rasgar era uma grande dor na minha infância, hoje acho graça. Até as escolhas que eu fiz para chegar até aqui me fazem pensar melhor comigo mesmo. Sem dor, a suavidade do agora ganha as cores da alegria.

Minha família ficou até surpresa comigo mais alegre. Na hora do jantar, eu servi a mesa com muita alegria e disposição. Nem as notícias do jornal tiraram o brilho do meu olhar. De repente é como se a vida não fosse mais o que ela é. Se cada dia de manhã eu acordasse assim, eu seria a pessoa mais satisfeita do mundo. Juro que eu não ia reclamar de nada nem de ninguém. Poderiam vender essa felicidade suave em comprimidos. Seria um sucesso e tanto! Imaginem só uma pessoa poder ser feliz tomando uma pílula. Até o governo iria querer comprar um negócio desses para melhorar a vida do povo. Um povo mais feliz é um povo que trabalha melhor e sem tanta angústia. Acho que eu até esqueceria da mágoa de ter perdido o meu antigo diário. Nele eu fazia tanta coisa legal. Tinha até poesia feita por mim. Não era lá essas coisas, mas eram minhas, e isso já faz delas algo especial no meu coração. Pena que eu não gravei nada do que eu escrevia. Uma pena eu não ter uma memória tão boa para gravar cada um dos meus versos. Só lembro de uma parte que era mais ou menos assim: “se perder no passado pode ser uma maneira de ajeitar o errado”. Enfim, não vou lembrar direito. Acho que vou voltar a escrever uns versos para me animar mais um pouco.

Agora é dormir para amanhã. Mas como eu queria que o dia de hoje se prolongasse por mais de 24 horas. Melhor ainda, por toda a eternidade. Ah! Isso sim me faria feliz a vida inteira.

(escrito, assim como os demais dias do diário, por Fernando Fidelix Nunes)

segunda-feira, 23 de abril de 2018

Da importância de se viver o presente no futebol e na vida


Da importância de se viver o presente no futebol e na vida




Demorei um pouco para escrever a respeito do futebol por conta dos compromissos como professor. Trabalhos autobiográficos – sim, pedi para que meus alunos escrevessem uma autobiografia para não haver risco de cópia da internet (e surgiram trabalhos maravilhosos que me fizeram admirá-los bastante) – e pendências burocráticas de diários ocuparam bastante as minhas semanas. Contudo, isso não foi o suficiente para que eu não assistisse à partida entre Palmeiras e Boca Juniors pela Libertadores na última quarta e não lamentasse os melhores momentos dos jogos contra Botafogo e Internacional pelo Brasileirão.

O empate contra o Boca, sem dúvida, trouxe em suas minúcias um conjunto de lições valiosas que extrapolam o futebol e podem ser facilmente aplicadas à vida. No domingo anterior meu verdão perdeu o Paulistão para o maior rival na nossa arena nos pênaltis. Foi uma derrota bastante dolorosa. Tão dolorosa que foi visível o quanto os jogadores estavam abalados. Lucas Lima, que errou um dos pênaltis no domingo, estava visivelmente abalado. No primeiro tempo, ele teve uma chance claríssima de abrir o placar. Uma bola rolada com açúcar caiu na sua canhota, que só foi capaz de produzir um chute sem absolutamente nenhuma força e pouco perigo para o gol do Boca Juniors, ou seja, o passado pesou na ação do presente. Isso parece absolutamente trivial do ponto de vista prático. Afinal, não vivemos o passado, vivemos o presente.

Entretanto, viver o presente não significa estar no presente. Quando mergulhamos o nosso pensamento no passado e nas angústias que ele nos trouxe, perdemos totalmente várias oportunidades de glórias no presente. O Palmeiras não vence o Boca, desde a Mercosul de 1998. Nossos jogadores perderam a oportunidade de olhar para frente e construir algo muito mais importante, que é a estrada do título da Libertadores – verdadeiro objetivo da equipe no ano.  A vitória praticamente asseguraria o primeiro lugar do grupo. Vamos ser justos em dizer que o nosso gol aos 44 e o empate aos 47 por si só é um fato chato, mas reclamar da sorte e sofrer com reviravoltas na Libertadores é a mesma coisa que um marinheiro reclamar do mar. A gente precisa se virar! Dar um jeito para o próximo jogo e montar uma estratégia efetiva. Errar faz parte do jogo e da vida. Só temos duas certezas na vida: a morte e os erros. Até os principais gênios de todas as áreas cometeram erros em momentos cruciais, mas, se eles vivessem dos erros, não construiriam nem mesmo um décimo de suas glórias.

Nos jogos contra Botafogo e Internacional o time ainda estava visivelmente abalado. Tanto que, no Pacaembu com bom público, Dudu se recusou a comemorar o gol da primeira vitória do verdão no Brasileirão. Recusar-se a comemorar um gol de um campeonato que é muito mais importante que qualquer estadual é errado e trágico. É como se dissesse para todos: “olha eu fiz algo importante e tenho muito a construir nesta temporada, mas estou ainda lamentando aquela derrota maldita!”. Se a derrota no Paulistão abalou tanto, imagina se fosse na Libertadores. Um jogador que tem medo de perder faz com que a vitória seja um acidente, pois estará sujeito a se abalar em qualquer circunstância do jogo. Dessa forma, o adversário passa a ter o poder de controle para fazer o que quiser com o emocional dos jogadores, e isso é absolutamente letal entre quatro linhas.

Mas uma decepção recente abalou de forma visceral nossos atletas a ponto de deixá-los cegos para o que acontece ao seu redor. Nossos atletas não enxergam o que eles têm pela frente: Copa do Brasil, Libertadores e Brasileirão. Tudo isso mais importante que o Paulistão. É preciso vibrar com cada lance desses campeonatos. Vamos voltar à casa do Boca depois de quase 20 anos! Aí vamos jogar pensando no passado o tempo todo? Óbvio que não deveríamos fazer isso. Jogador gosta de ir para campo com desafios assim: enfrentar um grande time, em um grande estádio e por um grande campeonato. Isso se ele estiver no presente. Se ficar pensando no passado, vai sofrer o tempo todo e sentindo dor com tudo que acontece hoje.

A temporada ainda não acabou e ainda está longe de acabar, mas, se o Palmeiras não pensar no que está por vir, já estamos acabados.

(Escrito por Fernando Fidelix Nunes)

domingo, 22 de abril de 2018

Proposta de redação sobre o combate ao abuso sexual no esporte

Mais uma proposta de redação no formato do Enem para vocês!


Com base na leitura dos textos motivadores a seguir e nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija texto dissertativo-argumentativo em norma padrão da língua portuguesa sobre o tema O COMBATE AO ABUSO SEXUAL NO MEIO ESPORTIVO, apresentando proposta de intervenção social que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista. 

As TRÊS primeiras redações postadas nos comentários serão corrigidas GRATUITAMENTE.

Textos motivadores:


(Proposta de Redação elaborada por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 20 de abril de 2018

Diário: 4 de julho de 2011



4 de julho de 2011.

                Sábado fui à casa dos meus sogros. A minha sogra foi toda falsa comigo. Ela não gosta de mim de verdade. Sempre que pode faz algo pra me atingir. É só ver como ela agiu uns 4 anos atrás comigo. Ela veio sábado com um bolo de presente para mim. Claro que eu sei que quem fez o bolo foi a Conceição. Agradeci a ela na frente dos outros, mas, reservadamente, dei um abraço carinhoso na Conceição. A minha sogra faz muita besteira. Agora ela anda cuidando mais do William, que anda dormindo por lá. Graças a Deus que ele saiu quando eu estava por lá. Esses mimos dela vão acabar de vez com o menino. Se bem que... pior do que ele tá não dá para ficar.
             A melhor parte para mim foi a conversa que eu tive com a Conceição enquanto a gente lavava a louça. Contei pra ela que eu andava desconfiada do Henrique com a Tereza. Ela falou que semana passada o Renato veio com a Tereza e pareciam estar melhores até, mas que ela duvidava. Afinal, as aparências enganam. Mas a vida dela não anda muito fácil não também. A filha dela está brigando com ela e com a neta o tempo todo. Elas ainda moram juntas lá em Planaltina. Vida em família é assim mesmo, infelizmente.
                Ontem eu ganhei um livro de presente da Giovana e um vale presente de 50 reais da loja O Boticário do Daniel. O Henrique pagou o almoço num restaurante. Como sempre, para eles me deixar sem cozinhar é como se fosse um presente. Uma droga isso. Às vezes eu fico querendo que uma doença me pegue e não me deixe levantar para ver se eu fico na cama e não vejo esse tanto de bobagem. Engraçado foi o livro que a minha filha me deu: “O Livro do Desassossego”, do Fernando Pessoa. Ela me confessou que nunca havia lido o livro e que resolveu comprar para que nós duas pudéssemos ler juntas. Muito estranho isso. Acho mesmo que ela só comprou o livro para ela ler. Assim... ela já estava de olho no livro e tinha que comprar um presente para mim, aí ela juntou os dois porque era mais conveniente. A vida é assim mesmo: a gente faz o que é conveniente, mas acaba sendo inconveniente com a qualidade das nossas relações. Engraçado como mais um ano passou e tudo mudou para no final não mudar nada.

(Escrito, assim como os demais dias do diário, por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 13 de abril de 2018

Diário: 1º de julho de 2011



1º de julho de 2011.

                Fiquei me sentindo mal com o que eu escrevi anteontem aqui no diário. Ainda bem que eu apaguei. Por mais que ninguém vá ler o que eu escrevi, isso não deve ser dito em lugar algum.
              Domingo vai ser meu aniversário de 52 anos de idade. Lá se vai mais uma primavera! As pessoas quando chegam a minha idade já começam a ter receio de fazer planos para o futuro. Eu mesma pensava chegar num futuro ideal, que hoje não passa de um presente abominável. Sabe... eu não gosto de viver a vida que nem um falso pregador. Não sei se vou conseguir mentir a minha tristeza no dia do meu aniversário. Talvez eu consiga, na verdade eu sempre consigo. A minha família deve ligar lá do interior de Minas. O problema de ser barato para ligar pelo celular hoje em dia é que as conversas ficam intermináveis! Uns 10 anos atrás a ligação era rapidinha para gastar pouco. Uma conversa de meia hora, que antes custava uns 20 ou 30 reais, hoje custa só 25 centavos num pré-pago qualquer. Para uma família que se gosta isso é muito bom, mas comigo não é.
                O melhor presente de aniversário para mim seria tirar essa dúvida em relação ao Henrique. Nesse fim de semana eu vou conversar com a Conceição para ela me dizer o que acha e o que pode saber sobre as coisas da família. Ela é uma pessoa muito sábia e que rodou muito. Eu realmente admiro essa mulher. Teve três filhos em Planaltina com três trastes que nunca assumiram nada. O filho do terceiro filho ficou com ela ainda uns 4 anos, mas no final a abandonou e nem pagou pensão direito, igualzinho aos outros. E quem diz que ela fica reclamando por aí? Nada a mulher botou para trabalhar e formou os 3 filhos na UnB. Dois viraram professores de Espanhol e uma virou arquiteta. Essa mulher foi trabalhadora mesmo! Isso que é um exemplo de superação. Quantas Conceições devem haver por aí? Muitas! E quem diz que elas recebem o reconhecimento que merecem? Agora uma que chegou na vida política ontem e não faz quase nada tem aprovação de metade da população.
              Hoje fui confrontada com uma pergunta desaforada dentro de mim muito forte. Eu ando pensando muito que o tempo deveria passar e até voar para ver se essa dor passa, mas será que ele não já voou o bastante? Parece que foi ontem que eu casei com o Henrique. Eu me lembro muito bem da minha falecida mãe me chamando “Márcia, não mexe nesse mato que aí seu tio já matou uma cobra esses dias!” Minha mãe era incrível mesmo, pena que na hora de me educar não me fez ver as coisas ruins de ser uma mulher do lar. Ficar na cozinha o dia inteiro era tão bom para ela. Sempre que eu via minha mãe eu via uma mulher feliz. Não interessava o pouco dinheiro nem os infortúnios do dia a dia. A vida podia ser um limão que a minha mãe fazia dela uma limonada para as crianças e uma caipirinha para os adultos que viviam por perto. Todo mundo gostava dela, inclusive eu.
                Pois é... três anos sem ela. Mas a vida segue.

(Escrito, assim como os demais dias do diário, por Fernando Fidelix Nunes)

segunda-feira, 9 de abril de 2018

Desabafo

        Um amigo meu, meio timidamente, pediu: "Fernando, lê um texto meu que foi um grande desabafo". Eu o li e gostei bastante! Como realista e com a certeza de que a dor pode ser um fator de coesão importante para todos nós, vi no texto o senso do sentimento real saindo do âmago da alma de um indivíduo que vivenciou um grande amor. Sugeri que fosse publicado no meu blog. Meu amigo pensou e concordou com a publicação desde que fosse colocado com um pseudônimo. Aceitei na hora. Segue o "Desabafo" do meu amigo Arthur Gonçalves, que passou por apenas algumas correções gramaticais que não alteraram em nada o sentimento do texto.

Desabafo!

        Eu juro que eu não consigo entender. Você prefere pôr tanta coisa na frente do Amor? Ou o nosso Amor que não te interessa mais? Ou talvez quase não tenha mais Amor. Estou desistindo de nós. Por quê? Porque dói, e dói demais. Noites sem dormir, enjoos, diarreias, falta de tranquilidade, ânsia de vômito, ansiedade 24 horas por dia. Meu corpo está pedindo arrego e o seu? (Isso é sofrer e perder um Amor de verdade, faz parte).
        Dia 7 de abril se passou e nada. Nem um "como você está?". Não fez falta? Não mandei mensagem porque quem quer se afastar é você. Eu queria estar jantando no Nebbiolo e rindo de piadas bobas, mas estava no boteco escutando um monte de putaria sem valor. Nisso que o mundo virou, mas fazer o quê, né?!
        Estou me fortalecendo para fazer meu último e maior gesto de Amor, que é deixar você ir. Deixar ser mais feliz (isso porque comigo já não se sentia completa). Achar alguém que te complete e te faça bem. Hoje, sinto que seu futuro será mais feliz sem mim. Mas calma, meu coração não consegue ainda... vou conseguir! Te prometo!

Tudo Muda para não Mudar Nada


Tudo Muda para não Mudar Nada


                O mundo é das injustiças e das incoerências; e, definitivamente, este não é um país sério. Primeiramente, é uma absoluta vergonha, na principal cidade deste país tropical, apenas a torcida da casa poder assistir aos clássicos regionais. Esse é apenas um dos sintomas da falta de democracia e civilidade em nosso país, ou seja, o futebol é apenas um reflexo da falta de tolerância em nossa sociedade, incapaz de mostrar sinais de melhora em vários setores.
O Palmeiras perdeu o título com uma série de problemas de arbitragem. Claro que a falta de sorte no gol e ineficiência nos lances ofensivos foram igualmente decisivos. Imaginem só o árbitro dar um pênalti e voltar na decisão, depois de quase dez minutos de debate, por conta da decisão do quarto árbitro, que estava ainda mais longe do lance! Eu acho que foi pênalti, pois a carga do Ralf em cima do Dudu foi exagerada e imprudente, mesmo que tenha pegado na bola. Já vi incontáveis faltas serem marcadas numa situação semelhante e serem justificadas pela mesma razão. No final ainda teve o Henrique desviando com o braço um cruzamento do meu Verdão. E o que aconteceu? Nada. Isso não acontece contra o Corinthians, que ano passado venceu o Vasco com a mão do atacante Jô, paladino da exaltação da ética futebolística quando lhe convém. Agora, seria muito mais lógico se houvesse o árbitro de vídeo. As pessoas questionariam muito menos o árbitro e ele não sairia do jogo desmoralizado pelos atletas, que, seguindo a canalhice intrínseca ao futebol, o pressionaram até na hora de marcar lateral no meio do campo. Não há qualquer justificativa para não ter a interferência do árbitro de vídeo em lances capitais, ainda mais numa final! Não custa tão caro assim para os padrões brasileiros. Infelizmente, as coisas são diferentes do que seria o melhor para todos. Nos pênaltis, o Corinthians foi mais competente e levou o troféu na nossa arena. Na verdade, na maioria das vezes, Palmeiras e Corinthians decidem um mata-mata nos pênaltis. Que falta que faz o Marcos numa hora dessas!
              Fazia 19 anos que Palmeiras e Corinthians não decidiam nada. A finalíssima daquele ano, que foi precedida pela conquista da Libertadores pelo Palmeiras (time responsável pela eliminação do Corinthians nesta competição), também teve muita confusão. O jogo nem acabou devido a uma pancadaria iniciada por embaixadinhas de Edílson, que nunca venceu a Libertadores. Naquela época, o Brasil também vivia muitas tensões. Desemprego, falta de perspectivas, incertezas internacionais e tensões políticas preocupavam muito o povo brasileiro. Um pedido de impeachment contra o então presidente Fernando Henrique Cardoso, feito pelo PT e com o apoio total de Lula, foi arquivado pelo então presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer. Inacreditável que tanto tempo depois as coisas não mudaram muito por aqui. A tecnologia avançou, as doenças mudaram, os remédios mudaram, mas parece que nossa institucionalidade ainda está mergulhada no mesmo buraco de sempre.
             Essa última semana talvez seja emblemática para a produção de textos absolutamente parciais. Os maiores defensores da imparcialidade e do equilíbrio na mídia e nas instituições seriam incapazes de difundir uma só linha a favor de seu raciocínio com as evidências dessa semana. A final do Paulistão e a repercussão da prisão de Lula são exemplos claros e inquestionáveis da parcialidade e da falta de responsabilidade de nossa sociedade. A página da Caneta Desmanipuladora deu um exemplo muito bom sobre as capas que trataram da histórica prisão de Lula. Numa foto ele é apresentado como um clandestino, em outra como um herói. Já dizia com tanta sabedoria o meu quase xará Ferdinand de Saussure: “o ponto de vista precede o objeto”.
                 Sobre a prisão do Lula, eu preciso desabafar: é sério que o juiz Sérgio Moro acreditou que o Lula ia se entregar em Curitiba às 17 horas de sexta-feira? Era óbvio que não! Quando eu vi a notícia, eu sabia que era mais uma decisão que não ia seguir o prazo. E depois foi acontecendo uma estranha negociação em que quase ninguém dava certeza do que ia acontecer, muito menos quando. Talvez seria melhor se tivessem chamado o Galvão Bueno para narrar do que os comentaristas de política, que foram ridículos ao repetirem à exaustão as informações e demonstrarem que não estavam à altura da importância do momento. Mas vamos dar um crédito, pois exigir que saia uma melancia de um pé de limão é demais. No fim das contas, o Lula foi preso, como queriam alguns e lamentaram outros. O ex-presidente, que chegou a ser carregado pela massa e impedido de sair da sede do Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo, deve ter tido como consolo nesta semana ao menos o título do seu time de coração, o Corinthians.
                Ontem eu ouvi na CBN um especialista em Direito Penal discutindo a parcialidade dos juízes, principalmente devido à celeridade do processo de Lula. Ademais, o comentarista defendeu veementemente que, no processo contra o líder das pesquisas de intenção de voto para presidente do Brasil, o réu não foi tratado de forma semelhante aos demais, ou seja, a imparcialidade ficou de lado, segundo o especialista, nesse caso também. Claro que ele também não é imparcial, e eu muito menos. Quer saber minha opinião? Lula foi se relacionar demais com gente sem vergonha, deu chance para o azar, “brincou de Deus e se queimou”, como diria Ciro Gomes - que por "coincidência" se apresentava em 1998 e 2002, tal qual o faz hoje, como alternativa para a dicotomia entre PT e PSDB. Agora tem gente que fez coisa muito mais pilantra e com muito mais evidências e “não dá nada, parcero”. Vejam só os déficits monstruosos de estados e municípios por aí e vejam quantos governadores e prefeitos foram responsabilizados. Vejam também os movimentos contra a corrupção. Uma vergonha não terem puxado um dia de manifestação contra Michel Temer, que já venceu duas denúncias e, como este não é um país sério, vai sair ileso da terceira sem uma única manifestação de vários grupos que são contra a corrupção.
            De fato, somos parciais, incoerentes, praticamos injustiças e às vezes somos vítimas, dependendo do ponto de vista, da justiça. Espero que o futuro mude, mas tudo indica que teremos confusões que serão bastante semelhantes ao nosso passado. Infelizmente, não imitaremos as glórias ou os grandes feitos, mas sim os seus acontecimentos mais estapafúrdios. Duvida? Acompanhe os próximos capítulos desse seriado nacional que nem o mais criativo dos roteiristas seria capaz de fazer e me diga se eu estou errado.


(crônica escrita por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 6 de abril de 2018

Diário: 23 de junho de 2011.


23 de junho de 2011.

                Voltei a falar com a minha filha, mas ela inventou de colocar uns poemas. Acho que desde que ela acabou a faculdade, foi a primeira vez que eu vi a Giovana lendo poesia. O negócio é que ela selecionou autores que todo mundo conhece, Camões, Drumond (acho que se escreve assim), Vinícius de Moraes e Manuel Bandeira. Nenhuma mulher! Com essas aulas de poemas que a minha filha dá, fica parecendo que não existe nenhuma mulher que escreveu poesia. Eu mesma só conheço a Cecília Meireles, e de nome. As coisas andam muito erradas nesse país, mas para não piorar a situação com ela, eu resolvi ficar quieta e apoiá-la. Afinal, pelo menos eles vão ler alguma coisa. E do jeito que eu ando, arrumar ou ficar pensando em confusão é pior ainda.
                Esse negócio de não valorizar a mulher é complicado pra todo mundo. Fizeram esses dias um jogo festivo para o Ronaldinho se despedir do futebol com a camisa da seleção. O menino ralou muito de verdade: infância difícil, joelho ruim e superações a todo instante. Mas e as mulheres? Quando veremos uma mulher sendo homenageada assim? A gente leva esse país nas costas e só vem depois o povo dar uma rosa pra gente no nosso dia em março. Parece piada um negócio desses. Tudo bem que tem umas que são uma vergonha e são valorizadas até demais. Deu no jornal que a Dilma tem 49% de aprovação do governo. 49% pra uma mulher que nunca fez nada é uma vergonha pra esse país tropical. Ela vai é queimar o filme das mulheres. O pessoal fica valorizando ela e tal com o passado dela contra a ditadura, só que ela não dá conta do recado. Tenho certeza de que vai fazer besteira. Do jeito que esse país é, é bem capaz do povo saber quem é Ronaldinho e não saber quem é Dilma. Isso dá um desgosto. Agora, pra substituir o Ronaldinho ainda arrumaram um tal de Neymar, que passa o tempo todo na televisão. Tem gente que faz o que quer e dá certo.
O Daniel continua fazendo um monte de besteira. Com o braço quebrado, ele vai ficar ainda pelo menos duas semanas em casa. Em casa mais ou menos, porque agora ele tá saindo de tarde com os amigos dele. Eu fico pensando se esse povo não estuda ou não trabalha. Eles ficam brincando e comemorando e eu aqui ralando com o meu chão e minha cozinha.
Se bem que ralar é até bom se eu for comparar com o pensamento. O Henrique anda feliz demais pro meu gosto. Ele anda feliz pra lá e pra cá. Deu até pra cantar de vez em quando. Só que aí ele me vê e deixa de lado tudo que é bom e fica meio esquisito. Esses dias eu tentei dar um abraço. Digo tentei porque ele nem devolveu nada em troca. Abraço só acontece quando tem troca. Se não tem troca, é contato. Quero muito estar errada. Ser traída a essa altura é terrível. Sinto-me humilhada só com essa oportunidade.
              Sigo querendo que o tempo voe, mas parece que eu vou ter que (sobre)viver por um tempo. Gostei desses parênteses. Pena que eu não tenho uma ideia boa dessas todas as horas pra deixar o meu texto mais literário. Se bem que ninguém vai me ler mesmo. 

(Escrito, assim como os demais dias do diário, por Fernando Fidelix Nunes)

segunda-feira, 2 de abril de 2018

Para que serve um estadual?


Para que serve um estadual?


                O campeonato estadual não levará um time de massa para jogar com potências ou várzeas internacionais. Tampouco garante que o time fique na Série A – veja só o caso recente do Vasco da Gama. O único aparente benefício é dar aos times de médio e pequeno porte um singelo passaporte para a Copa do Brasil, que se tornou uma montanha intransponível para um nanico das Séries C ou D se impor.
                Uma coisa não se pode negar: os estaduais dão uma dose de surpresa semanal ao nosso dia a dia. Grêmio em sexto na primeira fase no Gauchão, Corinthians perdendo em casa para o São Bento e Boa Vista na final da Taça Guanabara são apenas alguns dos exemplos cotidianos que apreciamos. Quando se vê um campeonato europeu, parece que ele já tem um destino traçado, com exceção do título recente do Leicester na Premier League. Não me lembro da última vez que Barcelona, Real Madri, Juventus, Bayer de Munique e outros gigantes europeus terminaram um campeonato fora das primeiras posições.
 No estadual não é assim, já que praticamente tudo é possível. O modesto Novo Hamburgo, por exemplo, se impôs ano passado contra o Grêmio (campeão da América!) e do Internacional e levantou a taça na cara da sociedade. No Paulistão, o Palmeiras, time com maior investimento nas últimas temporadas do futebol brasileiro, foi trucidado pela Ponte Preta em Campinas e não conseguiu reverter a vantagem em casa na semifinal. O estadual potencializa a essência futebolística do improvável tragicômico, que não se vê em outros esportes.
Os regulamentos também são um atrativo à parte. No Paulistão, por exemplo, as equipes do mesmo grupo não se enfrentam e o time só se classifica se ficar em primeiro ou em segundo lugar no seu grupo, isto é, se ele tiver a terceira melhor campanha da primeira fase e os outros 2 ficarem a sua frente, ele não passa para a fase em que se classificam 8 times. E o Cariocão que é tão truncado que nem eu mesmo me atrevo a explicar? Talvez seja uma maneira de desafiar a lógica eurocêntrica e preservar as peculiaridades locais. É como se dissessem assim: “aqui seguimos o movimento antropofágico”. E deu certo, pois os campeões da Taça Guanabara e da Taça Rio ficaram de fora da final, ou seja, foram dois troféus que não serviram para nada. Talvez seja uma política assistencialista de quinta categoria para distribuir mais troféus para os nossos clubes.
Deve-se destacar também as rivalidades que jamais teriam protagonismo nacional. Sport, Santa Cruz e Náutico, por exemplo, vivem confrontos apoteóticos na disputa rotineira pelo Pernambucano. Goiás, Vila Nova e Atlético/GO se enfrentam e alternam a hegemonia no principal estadual do Centro-Oeste. Em Santa Catarina, Figueirense, Avaí, Chapecoense e Joinville, que já chegaram a jogar ao mesmo tempo a Série A, dão muita emoção aos torcedores nos quatro primeiros meses do ano. E a dupla Bahia e Vitória que é há décadas sucesso de público e renda? O apoio da torcida do Bahia ao time na chegada à Fonte Nova foi uma coisa de cinema!
E as finais inesquecíveis? Os estaduais possuem as finais mais marcantes de longe. Nesse quesito o Carioca é especial. Como não lembrar do cruzamento de letra do Léo Lima do Vasco contra o Fluminense? E a cavadinha de Loco Abreu contra o Flamengo? E o gol de barriga de Renato Gaúcho no Fla-Flu? E a falta perfeita de Petkovic contra o Vasco? Esses são apenas 4 exemplares exclusivos dos nossos estaduais.
E a descoberta de novos craques? Quantos futuros gênios apareceram em um estadual? Rivaldo, por exemplo, foi um craque que surgiu no Mogi Mirim no início da década de 1990 e se tornou um dos protagonistas das Copas de 1998 e 2002 com a camisa canarinho. O grande São Marcos também começou a brilhar em um Paulistão, quando defendeu um pênalti contra o Botafogo/SP. Outros, embora não consigam protagonismo internacional, como o goleiro Cidão, conseguem pelo menos um lugar ao sol e, consequentemente, uma remuneração mais aprazível. Você é desses que falam que isso é coisa de antigamente né? Então, lembre-se de que Ganso e Neymar, que atualmente é um dos top 3 do futebol internacional, começaram a chamar a atenção com atuações marcantes no Paulistão com a camisa do peixe.
Portanto, distintos leitores e distintas leitoras, se você ainda é uma dessas pessoas que acham que os estaduais não têm importância, sugiro que você reveja os seus conceitos.