Para que
serve um estadual?
O
campeonato estadual não levará um time de massa para jogar com potências ou
várzeas internacionais. Tampouco garante que o time fique na Série A – veja só
o caso recente do Vasco da Gama. O único aparente benefício é dar aos times de médio
e pequeno porte um singelo passaporte para a Copa do Brasil, que se tornou uma
montanha intransponível para um nanico das Séries C ou D se impor.
Uma
coisa não se pode negar: os estaduais dão uma dose de surpresa semanal ao nosso
dia a dia. Grêmio em sexto na primeira fase no Gauchão, Corinthians perdendo em
casa para o São Bento e Boa Vista na final da Taça Guanabara são apenas alguns
dos exemplos cotidianos que apreciamos. Quando se vê um campeonato europeu,
parece que ele já tem um destino traçado, com exceção do título recente do
Leicester na Premier League. Não me lembro da última vez que Barcelona, Real
Madri, Juventus, Bayer de Munique e outros gigantes europeus terminaram um
campeonato fora das primeiras posições.
No estadual não é assim, já que praticamente
tudo é possível. O modesto Novo Hamburgo, por exemplo, se impôs ano passado
contra o Grêmio (campeão da América!) e do Internacional e levantou a taça na
cara da sociedade. No Paulistão, o Palmeiras, time com maior investimento nas
últimas temporadas do futebol brasileiro, foi trucidado pela Ponte Preta em
Campinas e não conseguiu reverter a vantagem em casa na semifinal. O estadual
potencializa a essência futebolística do improvável tragicômico, que não se vê
em outros esportes.
Os regulamentos
também são um atrativo à parte. No Paulistão, por exemplo, as equipes do mesmo
grupo não se enfrentam e o time só se classifica se ficar em primeiro ou em
segundo lugar no seu grupo, isto é, se ele tiver a terceira melhor campanha da
primeira fase e os outros 2 ficarem a sua frente, ele não passa para a fase em
que se classificam 8 times. E o Cariocão que é tão truncado que nem eu mesmo me
atrevo a explicar? Talvez seja uma maneira de desafiar a lógica eurocêntrica e
preservar as peculiaridades locais. É como se dissessem assim: “aqui seguimos o
movimento antropofágico”. E deu certo, pois os campeões da Taça Guanabara e da
Taça Rio ficaram de fora da final, ou seja, foram dois troféus que não serviram
para nada. Talvez seja uma política assistencialista de quinta categoria para
distribuir mais troféus para os nossos clubes.
Deve-se
destacar também as rivalidades que jamais teriam protagonismo nacional. Sport,
Santa Cruz e Náutico, por exemplo, vivem confrontos apoteóticos na disputa
rotineira pelo Pernambucano. Goiás, Vila Nova e Atlético/GO se enfrentam e
alternam a hegemonia no principal estadual do Centro-Oeste. Em Santa Catarina,
Figueirense, Avaí, Chapecoense e Joinville, que já chegaram a jogar ao mesmo
tempo a Série A, dão muita emoção aos torcedores nos quatro primeiros meses do
ano. E a dupla Bahia e Vitória que é há décadas sucesso de público e renda? O
apoio da torcida do Bahia ao time na chegada à Fonte Nova foi uma coisa de
cinema!
E as finais
inesquecíveis? Os estaduais possuem as finais mais marcantes de longe. Nesse
quesito o Carioca é especial. Como não lembrar do cruzamento de letra do Léo
Lima do Vasco contra o Fluminense? E a cavadinha de Loco Abreu contra o
Flamengo? E o gol de barriga de Renato Gaúcho no Fla-Flu? E a falta perfeita de
Petkovic contra o Vasco? Esses são apenas 4 exemplares exclusivos dos nossos
estaduais.
E a descoberta
de novos craques? Quantos futuros gênios apareceram em um estadual? Rivaldo,
por exemplo, foi um craque que surgiu no Mogi Mirim no início da década de 1990
e se tornou um dos protagonistas das Copas de 1998 e 2002 com a camisa
canarinho. O grande São Marcos também começou a brilhar em um Paulistão, quando
defendeu um pênalti contra o Botafogo/SP. Outros, embora não consigam
protagonismo internacional, como o goleiro Cidão, conseguem pelo menos um lugar
ao sol e, consequentemente, uma remuneração mais aprazível. Você é desses que
falam que isso é coisa de antigamente né? Então, lembre-se de que Ganso e
Neymar, que atualmente é um dos top 3 do futebol internacional, começaram a
chamar a atenção com atuações marcantes no Paulistão com a camisa do peixe.
Portanto,
distintos leitores e distintas leitoras, se você ainda é uma dessas pessoas que
acham que os estaduais não têm importância, sugiro que você reveja os seus
conceitos.
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