sábado, 31 de março de 2018

Conto: Um Dia a Casa Cai

Olá!
Começaremos a publicar contos!
Eu (Fernando) vou começar com um conto que não é meu nem do Renato. Esse conto foi feito por uma pessoa muito próxima a mim que quis ser chamado de João Aleixo.
Apreciem um pouco de regionalismo!



UM DIA A CASA CAI

Sargento Raimundo telefonou  ao Cícero:
– O bicho está pegando! O Capitão quer falar comigo amanhã;  na primeira hora do expediente. Vamos agora  ao Jatobá. Lá conversaremos melhor. 
Montou na moto e partiu ao sítio Jatobá, situado à margem direita do rio Pajeú,  município de São José do Egito, porém bem próximo de Tuparetama.
Raimundo comprou o sítio há seis anos. Tinha especial apego à região, ali nasceu e morou até a adolescência. Furou poços, plantou frutíferas e cercou bem a propriedade. A safra de caju está iniciando e os pés de manga espada estão carregados de frutos verdes. Abriu a porteira, avistou um caju maduro ao alcance das mãos e foi coletá-lo. Olhou em direção ao centenário mulungu. A presença do mulungu  pesou na decisão de comprar o terreno. Quando foi ver a terra para comprá-la, avistou xexéus-de-bananeira se alimentando do néctar das flores do  mulungu. Tinha grande admiração pela ave e, quando menino, se sentia frustrado por nunca tê-la capturado. Faz plano que, após a aposentadoria, deixará as atividades ilegais e trabalhará apenas no sítio. Quando estava chupando o caju, Cícero apontou e Raimundo falou:
–Tenho boas razões  para pensar que  o Capitão quer falar comigo sobre a agiotagem que pratico no quartel e na cidade. Posso até afirmar que o agiota é você, eu apenas indico, porém ele não vai acreditar. Ninguém pode provar, mas todo mundo desconfia que você seja apenas meu testa de ferro. Segundo informações, os precedentes dele não são animadores; quando serviu em Custódia, um dia, reuniu toda tropa e disse que quem estava devendo a um Cabo dinheiro de agiotagem não deveria pagar e qualquer reclamação poderia provocar expulsão do criminoso da PM e a abertura de processo  para colocá-lo na cadeia.
Cícero responde:
– Está comigo a planilha com a contabilidade dos empréstimos; se é assim o procedimento do Capitão Olavo, o prejuízo será grande. Pior seria se ele desconfiasse do tráfico de drogas.
Raimundo: 
– O tempo é muito curto para pensar em assassiná-lo. Matar um Capitão  da PM não é como eliminar um pé rapado, mas a hipótese não pode ser descartada.
Raimundo lembrou-se do caso de Zé Aragão, rico fazendeiro: ele não queria pagar um dinheiro emprestado e Raimundo entendeu que seria mais fácil receber da viúva. O caloteiro e uma amante casada tiveram mortes consumadas na saída de um motel. Raimundo, deliberadamente, comandou a equipe policial que fez a ocorrência do fato. O sucesso do plano se completou quando familiares do morto mataram o marido da amante e a viúva reconheceu o cheque e quitou a dívida.  
Depois que a quadrilha de Raimundo entrou no ramo de tráfico de cocaína, assassinatos  de consumidores  falidos e traficantes aliciados pela quadrilha, que por vários motivos  são condenados à morte.  São corriqueiros esses homicídios em São José do Egito. Recrutar mão de obra nova ao tráfico de drogas e à pistolagem é muito fácil.
Um popular que gosta de acompanhar notícias policiais contou 10 homicídios de janeiro a outubro desse ano com as mesmas  características: os assassinos são sempre uma dupla encapuzada montada em moto, as vítimas são atingidas por muitos tiros, as  armas usadas são de grossos calibres, a polícia nunca chega no momento oportuno e nenhum desses homicídios foi esclarecido. A mais impressionante dessas mortes foi a do jovem de 17 anos abatido com 21 balas de pistola calibre 380 dentro de sua própria casa e na presença de familiares. A polícia espalha que é briga de gangs. O popular acha improvável bandidos pés de chinelo donos de armas poderosas e exímios atiradores. Desconfia que os matadores sejam policiais, porém, com medo, não comenta essa possibilidade. Ele tem notícias que em muitas cidades do Sertão nordestino existem quadrilhas compostas de policiais e ex-policiais e que apenas eles podem traficar drogas e roubar. Surgindo concorrência de algum paisano, este será morto. A justiça é conivente e o clero omisso. A situação é semelhante a certo trecho do “Sermão do Bom Ladrão” do padre Antônio Vieira, escrito em 1655: “De um, chamado Seronato, disse com discreta contraposição Sidônio Apolinar: Seronato está sempre ocupado em duas coisas: em castigar furtos, e em os fazer. Isto não era zelo de justiça, senão inveja. Queria tirar os ladrões do mundo, para roubar ele só”. Padres deveriam recitar sempre nas missas este sermão, porém assim como os juízes, têm medo.
Ninguém desconfia de que esses homicídios tenham relação com Sargento Raimundo, embora os crimes aconteçam sempre em seus plantões noturnos. A quadrilha é organizada em níveis, apenas Cícero sabe que Raimundo é o chefe.    
Raimundo entrou na PM aos 20 anos de idade. Logo pegou fama de corajoso e decidido. Quando um Juiz resolveu intervir no presídio de Caruaru após uma  guerra sangrenta entre presos, Raimundo foi convidado à missão. O tenente PM interventor escalou Raimundo para ser o Chefe de Disciplina, dando-lhe  carta branca visando o fim do controle do presídio por reclusos. A pedido de Raimundo foi construída uma cela especial para torturar presos e que tinha como única entrada e saída o escritório da Chefia de Disciplina. A tortura era sempre uma surra; Raimundo e outro soldado mandavam o preso ficar apenas de cueca e de surpresa recebia um açoite nas costas produzido por uma vara de cerne de pau-d’arco-amarelo de 80 cm de comprimento e 2 cm de diâmetro. A primeira pancada, dada no lombo, era tão forte e doída que esmorecia qualquer ser humano e  a surra só terminava quando o preso desmaiava. Essa vara ganhou o apelido de  “direitos humanos”. Bastava um preso reivindicar esses direitos para que a vara fosse chamada. Foi um sucesso a intervenção, apelidaram o presídio de “convento” e os presos  chamados de “freiras”,  tal a paz reinante. Todos presos novos eram recebidos com esse espancamento, com exceção  daqueles que chegavam recomendados  por alguma autoridade. Os encarcerados sem recursos eram os que mais apanhavam. Se livre o pobre sofre, dentro da cadeia é muito pior.  Com o passar do tempo, Raimundo enxergou a oportunidade de ganhar dinheiro no presídio, rotineiramente com pequenos empréstimos a juros e venda de mercadorias  a presos e se aparecesse uma oportunidade praticava extorsão. Também era usual o assédio sexual feito por toda tropa a mulheres parentes de presos. Um bárbaro assassinato de uma adolescente, filha de preso, praticado por um carcereiro rejeitado por ela, desencadeou a volta de toda equipe ao quartel da PM. Confirmou-se: corno brabo é um desastre na certa. Mesmo não trabalhando mais na penitenciária, Raimundo perdeu pouco dinheiro nessa mudança; a cobrança era truculenta aos parentes dos presos devedores.   
Raimundo ordena:
– Coloque um motoqueiro para vigiar o Capitão e sua família a partir hoje. Claro que não teremos informações para reverter minha posição momentaneamente, mas a guerra será longa e ele  ganhará apenas essa primeira  batalha. A autoconfiança de Raimundo não é mera ilusão; ela se sustenta numa logística perfeita. A quadrilha consegue as informações que quiser da cidade e tem contatos valiosos nos municípios vizinhos.
Às três horas da manhã, Raimundo recebe telefonema de Cícero:
– O micro-ônibus que transporta estudantes que fazem faculdades em Patos foi assaltado antes de Brejinho. A mulher do Capitão é uma das vítimas. O motorista do micro-ônibus é o Pedro, que rapidamente deixou o pessoal de São José do Egito e foi para Tabira.
Raimundo não conciliou mais o sono. Às cinco horas partiu de automóvel para Tabira para falar com Pedro.
O motorista contou pormenores do assalto: os passageiros vinham de uma festa de formatura, todos muito chiques; foram quatro assaltantes jovens; levaram dinheiro, joias e celulares, porém o fato mais grave foi o estupro da mulher do Capitão. Um dos bandidos escolheu para estuprar a sobrinha da esposa do Capitão e ela se ofereceu para substituí-la. Um dos malfeitores disse que tinha sido convidado para um assalto e não para estuprar mulheres. O ladrão que parecia ser o líder do bando insistiu no estupro, porém aceitou a troca sugerida. Como os assaltantes falaram da Serra de Teixeira, Pedro acha que  eles são de Patos. Ao menos dois criminosos tinham sotaque paulistano. Raimundo pediu segredo da visita.    
Raimundo telefona a Cícero e ordena contatar receptadores de objetos roubados e traficantes de drogas em todas as cidades da região. Ele sabe que vai ser fácil a polícia desvendar esse crime, porém quer se adiantar e ser o responsável pela prisão dos meliantes. Se o plano der certo o Capitão deixará de importuná-lo.
Antes das oito horas Raimundo chegou ao quartel. Toda tropa já sabia do acontecimento. Tal o esperado, o Capitão não compareceu ao expediente. Ás dez horas o Tenente chamou Raimundo. Estava em sua sala um homem de nome Arthur, Sargento da PM lotado em Recife, que foi apresentado como irmão da mulher  do Capitão e pai da moça vítima do assalto. Também presente Pedro, o motorista assaltado. O Tenente ordena a Raimundo que prepare uma viatura, que irão fazer uma diligência no local do assalto.                                                                  
O Tenente foi no banco carona e Raimundo, Pedro e Arthur no banco traseiro. Nota-se que Arthur está perturbado de ódio ao extremo.
Arthur diz:
– Muitas famílias que migram ao Sul acham que mandando de volta ao nordeste filho bandido, haverá regeneração, bem como não será executado por policiais ou rivais do crime. Porém, a maioria não se emenda e bandido que aqui atua dessa maneira é morto rapidamente.
Cabo Antônio, o motorista, diz:
– Esse tipo de marginal deveria ser castrado.
Raimundo, confiando no sentimento da vingança entranhado na cultura nordestina, responde insuflando Arthur:
- Pode ter certeza, esses não ficarão vivos e devem sofrer um pouco para morrerem. Lembro-me de um caso em Caruaru: um homem de meia idade alugou a casa de fundos  e  seduziu uma garota de treze anos de idade, filha do senhorio. Os tios da menina se reuniram, prenderam o abusador, e antes de queimá-lo vivo amarrado em pneus de caminhão, caparam-no. Toda polícia sabia quem eram os autores da morte, porém ninguém moveu uma palha para processá-los. Ficou por isso mesmo.
Vasculharam bem a área, mas não conseguiram nada importante à elucidação do crime. O tenente diz que o melhor é voltar, chamar todas as vítimas visando alguma pista e fazer um inventário completo e minucioso dos objetos roubados. Raimundo assistiu ao depoimento das vítimas. O tenente decidiu que no  dia  seguinte, pela manhã, iriam a Patos pedir ajuda à polícia paraibana. Raimundo pediu o número do telefone de Arthur. Às vinte e uma horas Cícero telefona dizendo que em Flores, segundo um traficante, um pessoal de Afogados da Ingazeira  com essas características o procurou para trocar cocaína por joias, mas como não tinha a droga no momento e está esperando para amanhã um carregamento, trocaram maconha por uma joia e acertaram que  telefonariam confirmando a chegada da cocaína. Raimundo imediatamente  telefonou ao Tenente pedindo para não acompanhá-lo a Patos porque tinha uma emergência em seu sítio. O tenente concordou.
Raimundo pegou  Cícero e partiram para Flores. Junto com Mário, o traficante, planejou a cilada para capturar os meliantes: o local da prisão será uma tapera abandonada situada a dois quilômetros do asfalto. Cícero entrega a Mário uma  porção de cocaína tipo “escama de peixe” que será o chamariz para levá-los à emboscada. Mário liga ao chefe da quadrilha combinando o negócio para onze horas de amanhã.
         Vinte minutos após o Tenente partir para Patos, Raimundo telefona a Arthur dizendo que tem informações seguras de um comprador de ouro em Flores que uns rapazes de Afogados combinaram para vender joias hoje e o convida à diligência.  Arthur prontamente aceitou o convite. Raimundo pede-lhe que vista uma roupa de polícia visando à camuflagem na Caatinga.
Chegam ao local preparado à emboscada às nove e meia e assim terão tempo suficiente  para trabalhar os pormenores da ação. De dentro da tapera, Raimundo escolheu os lugares menos visíveis ao bando para aproximação da polícia no momento da abordagem. Fizeram uns remendos na tapera, deixando apenas uma abertura como saída rápida.  O fator surpresa e o maior poder de fogo serão o grande trunfo da polícia. Testaram os equipamentos de rádio e os quatros se acomodaram nos locais escolhidos para cada um.
Combinou-se com o traficante, que ele, acompanhado de um companheiro, se encontrará com os bandidos no asfalto, exibirá  a amostra da cocaína e os atrairá à tapera. Chegando à tapera averiguará as joias, fornecerá a droga para experimentação e dirá que buscará a quantidade de cocaína acertada na negociação.
Quando o traficante saiu, os bandidos ficaram ao redor de um prato preparando a cocaína para consumir. Raimundo comunica aos companheiros que é chegado o momento da abordagem, se aproxima da tapera e grita:
– É a polícia! Estão cercados! Saiam de mãos para cima ou vai acontecer o pior!
Os bandidos em primeiro momento ficaram imóveis, trocaram palavras e como todos estavam armados com revólveres decidiram-se pelo confronto. Saíram da tapera atirando para todos os lados. Três foram abatidos. Um, num salto circense, alcançou uma moita de mufumbo e desapareceu da vista de todos. Conferindo o estado dos três rapazes caídos, apenas um ainda respirava.  Raimundo deu um tiro de misericórdia na cabeça no rapaz ainda vivo. Sem perda de tempo iniciaram a caçada ao fugitivo.
Raimundo vasculha o local em que o bandido desapareceu e encontra sangue, sugerindo grave ferimento.  Uma juriti voou assustada de um fechado partido de favela entremeado de jurema-preta, indicando que  fugitivo está no local.
Raimundo grita:
– Os outros estão mortos, você tem a oportunidade de sair vivo, se entregue.  
O homem se rende. Pelas informações colhidas, Raimundo deduz que o sobrevivente é  o líder do bando. O ferimento no braço ainda sangra e o homem está esmorecido. Raimundo lhe dá um pouco d’água para  reanimá-lo e o algema abraçado em tronco de angico distante cento e cinquenta metros da tapera. Raimundo pergunta pelas joias e ele diz que não estão consigo. O soldado fica vigiando o preso, Raimundo e os outros vão revistar os mortos e nada encontram.  Confabulam sobre a situação e decidem que a melhor solução é matar o sobrevivente, enterrar os quatro em vala comum e incendiar o automóvel da quadrilha em lugar diferente.   Raimundo pega no porta-malas do seu carro duas picaretas, uma pá e um enxadeco e ordena  que Cícero  inicie a escavação da vala.
Raimundo volta  com Arthur  ao local onde está o bandido ferido e interroga sobre as joias:
– Temos certeza que antes do tiroteio você estava com as joias. A demora de socorro médico pode significar sua morte. Dizer logo onde estão as peças é mais sensato, sem elas não sairemos daqui.
O preso confessa:
– No início da fuga joguei-as em uma moita de alastrado perto de um grande pé mandacaru.
 Arthur enxerga uma bolsa e com uma vara a retira da moita de alastrado. Observando as joias reconhece a pulseira de ouro da filha. Retiram a algema do preso e o guia para o local onde estavam os cadáveres.
Quando chegam ao local Artur  diz ao bandido:
– Estuprador da sua laia não fica vivo!
O bandido ainda tenta correr, mas, debilitado, não consegue e Arthur acerta-o com três tiros.
No outro dia cedo Raimundo é chamado à sala do Capitão. Na presença de Arthur parabeniza-o pela missão e que depois falaria com ele a respeito de outras questões. Trata-o como amigo e não um subordinado. Raimundo convida os dois para almoçar um guiné em seu sítio. Prontamente aceitam. Combinam que ele iria agora e que Cicero os procuraria ao meio dia para guiá-los.
Raimundo segue ao sítio. Tinha prendido três guinés e iriam à panela. Tinha orgulho  da sua rapidez para tratar e cozinhar aves.
Ao chegar ao sítio encontra dois rapazes colhendo mangas. Solta um grito de alerta e um dos homens correu passando por baixo da cerca de arame farpado. O outro vem ao seu encontro, nota-se um adolescente de uns quinze anos. Diz que estavam com fome e resolveram comer umas mangas quase maduras. Raimundo, sob o domínio da soberba, resolve lhe dar uma lição que sirva como aviso: pega o menino pelo braço fortemente, saca a pistola,  esfrega a arma no rosto do garoto, com um empurrão o faz cair e aos chutes expulsa-o da propriedade.
Ao terminar de tratar as aves, vê que falta colorífico, para ele um tempero essencial. Irá a Tuparetama compra-lo. Quando abre o portão recebe um tiro no peito. O estampido é de calibre 12. Ainda enxerga o garoto espancado horas antes.  Saca a pistola, mas a vista fica turva. Pressente a morte.
(João Aleixo)

sexta-feira, 30 de março de 2018

Diário: 20 de junho de 2011





20 de junho de 2011.

                Nada tem dado certo ultimamente comigo. A Giovana me olha com um olhar de desprezo, o Daniel quebrou o braço depois de uma noitada com o bonde de idiotas dele e o Henrique anda escondendo algo de mim. O meu marido atendeu dois telefonemas meio escondido de mim. Tá na cara que ele quer esconder algo. Eu também quero esconder que desconfio, mas não sei se faço isso bem.
                Eu conheço meu marido. Isso é mulher. Ele tem tido cada vez menos vontade de ficar comigo. Agora quem pode ser? Fico com a cabeça rodando essa pergunta e sofrendo com a minha possibilidade: Tereza. Essa mulher sempre assombrou os meus pensamentos. Eu deixei isso quieto por um tempo, mas essa ideia sempre volta para a minha cabeça com uma intensidade que eu não dou conta de controlar. Fico ofegante e acabo dentro do banheiro chorando para ninguém me ver. Só saio do banheiro quando eu me acalmo. O estranho é que, mesmo de tarde, quando eu costumo ficar sozinha em casa, eu fico no banheiro. Não chego a deitar no chão. Sento, me encosto na parede e escondo minhas lágrimas entre os meus braços e joelhos. Eu sei que isso é coisa de adolescente, mas é isso que eu faço. Diário serve pra isso: confessar o que nunca ninguém vai saber.
                Tudo bem que segunda é dia de uma nova semana, mas eu não queria essa semana para mim. Tem dias em que a gente não quer viver. Seria melhor simplesmente se pulasse uns 100 dias e tudo mudasse. Impossível mudar para pior. Tem gente que diz que pode piorar, mas eu duvido muito. De resto é ir vivendo e aguentando.

(Assim como todos os outros dias do Diário, este foi escrito por: Fernando Fidelix Nunes)

domingo, 25 de março de 2018

Proposta de redação: Fake News (Notícias Falsas)

Olá a todos!

Começaremos hoje a postar periodicamente propostas de redação no formato do Enem. Cada proposta de redação terá uma cota de redações que serão corrigidas GRATUITAMENTE. Que tal começar a se preparar desde agora?

Com base na leitura dos textos motivadores a seguir e nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija texto dissertativo-argumentativo em norma padrão da língua portuguesa sobre o tema OS IMPACTOS DAS NOTÍCIAS FALSAS (FAKE NEWS) NA SOCIEDADE BRASILEIRA DO SÉCULO XXI, apresentando proposta de intervenção social que respeite os direitos humanos. Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista. 

As três primeiras redações postadas nos comentários serão corrigidas GRATUITAMENTE.

Textos motivadores


(feito por: Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 23 de março de 2018

Diário: 12 de junho



12 de junho de 2011.

                Inacreditável! Definitivamente este não é um país sério de verdade. Caiu na redação do vestibular da UnB a tal da variação linguística. O que passa na cabeça desse povo pra cair um tema desses? Tanta guerra, tanta mudança e tanto problema no mundo e eles vão escolher logo essa porcaria. A Giovana falou num tom extremamente desagradável. Fingi que não dei bola e não prolonguei a discussão. Não tem pra que discutir esse tipo de bobagem com ela. Eu só perco tempo com ela. Mas sabe como é... família a gente tem que ficar por perto sempre.
                O Henrique me deu de presente “surpresa” pelo dia dos namorados: uma rosa. Ele a tirou da rua, como é domingo, ele não tinha como comprar. Já até acostumei, então nem ligo mais com essas coisas. Mas o que aconteceu ontem me deixou angustiada. Um amigo do Henrique ligou aqui perguntando por ele. Disse que ele tinha saído e que quando voltasse eu avisava. Era pra ver um jogo. O problema é que o Henrique saiu dizendo que ia ver o jogo com esse amigo. Agora... por que ele resolveu mentir para mim? A minha cabeça às vezes sofre mais com hipóteses do que com a realidade. Sofremos mais com a imaginação do que com a razão. Nem consigo escrever direito com a minha cabeça presa nessa hipótese. Odeio ser feita de trouxa, ainda mais pelo meu marido.
                A vida é um imprevisto atrás do outro. Quando a gente pensa que a rotina é ruim, vem algo pior para quebrar também o nosso coração.

(escrito, assim como os outros dias do Diário, por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 16 de março de 2018

Diário: 7 de junho de 2011




7 de junho de 2011.

                Hoje caiu um ministro: o Antônio Palloci renunciou. Deve ter sido medo de ser mandado embora pela “chefa”. Ele acha que o povo acredita que aumentou o patrimônio em 20 vezes sem fazer nada ilícito. Conta outra! Pelo menos essa vê alguém metido em algo errado e manda embora logo. O outro botava tudo em panos quentes e deixava rolar sem problema nenhum. Eles acham que é assim mesmo: fazem algo errado e ninguém vai atrás para investigar. Esse país está impregnado de gente suja no poder. Nunca investigam um engravatado. Agora vai o povo andar um pouquinho acima do limite de velocidade para ver o que acontece. E o que me deixa mais irritada é que esse povo é pego com a boca na botija e se faz de dissimulado. É “eu não sabia” pra cá e pra lá e com carinha de inocente vão enganando o povo trouxa até a próxima eleição.
                O mundo é assim mesmo: cheio de injustiças. Só que uns pagam pelos seus erros e outros têm seus erros pagos pelos outros. Nossa! Que ruim ficar repetindo “outros” na mesma frase. Se minha filha não fosse uma professora tão ruim, pedia a ela umas aulinhas para aprender a escrever melhor. Neste fim de semana vai ser o vestibular com a temível prova de redação. Ela, só pra ser do contra, falou que um dos cinco temas possíveis do vestibular é a tal da variação linguística, porque o pessoal da UnB conversou muito sobre o que a mídia chamou de escândalo do livro didático que ensina os alunos a falar e a escrever errado. Ela devia ter vergonha de ficar botando essas besteiras na cabeça dos alunos e ensinar português direito. Segundo ela, os alunos estão aprendendo a escrever melhor. Ela diz que eles estão animados e estão até tirando dúvida pela internet com ela. Eles devem ter aulas muito ruins para falarem tão bem da minha filha. Quero só ver quando sair um outro tema e ela ter que se explicar “é... não dá pra acertar sempre”. Nesse caminho, a educação não vai a lugar nenhum.
                O Daniel só tá andando com gente besta. Ele fechou a porta esses dias para ninguém ouvir ou prestar atenção no que ele fala, só que ele se esqueceu de que o som atravessa as paredes quando você fala alto. Uma vergonha! Ele estava rindo alto com a história de um amigo que ficou levando bolsada de uma mulher na frente do trabalho porque ela descobriu “os rolês do Carlota”. Em vez de ler um livro ou estudar para concurso, eu vejo o meu filho fazendo essas bobagens. Ele podia arrumar uma menina ajeitadinha para ver se tem alguma coisa nova. A vida é assim: apesar de nós sabermos o melhor caminho a seguir, caímos no caminho que nos leva para o inferno de nossas escolhas. Tudo pode ser diferente, basta querer e saber fazer. Essa rima ficou péssima! Mas é como a Conceição sempre diz: “homem usa a mulher pra se divertir, se não for pra sexo, é pra rir”.
                Sinto falta de escrever mais. No início do mês passado eu escrevia mais, só que o tempo vai diminuindo. É casa pra cuidar, roupa pra lavar, almoço pra preparar e o diário tem de esperar uma fugidinha minha. É tão bom escrever. Sinto como se a minha mente se libertasse da barreira da aflição. No mais é ir vivendo e aguentando o tranco.

sexta-feira, 9 de março de 2018

Diário: 5 de junho de 2011




5 de junho de 2011.


                O almoço de hoje foi um fato raro. A família inteira estava reunida na casa espaçosa do seu Agenor e da minha “querida” sogra, dona Aurora. Os primos do Henrique estavam todos lá: Joana e Anderson, filhos da falecida Antônia e do falecido Reinaldo, tio do Henrique; Renato e Roger, filhos do Reginaldo e da falecida dona Maria – era uma senhorinha adorável.
                O Gustavo, filho do Dênis e da Joana, está muito bem. Fiquei sabendo que acabou de ser nomeado na Câmara dos Deputados para o cargo de técnico administrativo. Ninguém falou, mas ele vai ganhar grana o suficiente para o resto da vida. Na verdade, nem precisava falar nada disso. Ele contou que passou dois anos estudando de manhã e de tarde, cursinho pela manhã e à tarde revisava o conteúdo e fazia exercícios. Ele é um rapaz bem instruído e organizado, o que é a base dessa conquista dele mesmo. Queria que o Daniel também fosse assim, mas, se continuar nessa situação, ele não consegue emprego de nada que dê dinheiro de verdade. Vai viver encostado dando trabalho aqui em casa.
                Já o André, filho do Anderson e da Lúcia, virou um playboy da pior espécie. Todo fortinho e cheio de si, ele fala alto chamando a atenção e bebendo muito. O cara tem 32 anos e nunca trabalhou nem 30 horas numa semana na vida. Só fez estágio. Fez uma faculdade qualquer e fica mamando na teta dos pais até hoje. O engraçado é que os pais sempre foram bem certinhos e acabaram criando um vagabundo. A vida tem dessas coisas: às vezes sai uma jaca podre de um pé de caju.
                Agora o pior de todos foi o William, filho do Roger com a Ana. Ela tinha um problema que a impedia de ter filhos. O único caminho então é adotar, eles pensaram. Só que o moleque é uma bomba. Adotaram quando tinha 5 anos. De lá pra cá a vida deles virou um inferno! Na infância o menino só arrumava confusão; na adolescência começou a mexer com droga e com uma turminha da pesada – tiveram até de ir na delegacia buscar o garoto; e agora, na casa dos vinte e tantos anos resolveu virar travesti. Isso já tem um tempo. Uma vergonha completa. Só a dona Aurora e a Giovana falam com ele, que inventou de querer ser chamado de Alana. Onde já se viu um negócio desses? Para mim e para o resto da família ele vai continuar sendo o William mesmo. Já até tentaram tratar o menino, mas nunca deu certo com nenhum psicólogo ou psiquiatra. Não tem medicamento ou terapia que dê jeito.
                O Pedro e a Paula, filhos do Renato e da Tereza, vivem meio brigados, mas na hora de ficar em família nem parece que eles se detestam. A Paula está toda feliz porque vai casar com um americano, um tal de Bryan que veio estudar doutorado na UnB. Não sei o que ele veio fazer aqui. Eu, se fosse ele, ficava por lá mesmo. Agora o Renato e a Tereza que estão vivendo um verdadeiro caos. Dona Aurora me contou que os dois chegaram a passar uma semana separados, mas decidiram reatar. Isso foi um pouco depois do carnaval. É uma relação que mais sobrevive do que vive. O desfecho dessa história me intriga, porque eu sei que o Henrique ainda sente alguma coisa pela Tereza. Se ela der chance a ele, tenho certeza de que ele vai em cima. E eu aqui sofrendo com o destino.
                O seu Agenor não demonstrou, mas eu sei que ele sentiu a morte do Reginaldo. A pessoa, com o tempo, já viu muita coisa ruim e tem de aprender a disfarçar o seu coração em certas convenções sociais.
                Uma parte boa foi rever a Conceição, empregada da minha sogra. É tão bom falar com ela. Aquilo sim que é pessoa eficiente e séria. Nunca vou conseguir fazer a feijoada do mesmo jeito que ela faz, por mais que eu me esforce. Pena que a vida dela é muito complicada, principalmente pela relação que ela tem com a filha. Mas é impressionante que nada disso tira  a força dela de lidar com os problemas da vida. O negócio é seguir em frente e ir vivendo, apesar da dor da ausência continuar no coração.

sexta-feira, 2 de março de 2018

Diário: 31 de maio



31 de maio de 2011.

                Final de mês sempre é bom para pensar no que passou. Quando a folha do calendário vira, também terminamos mais uma página nossa. A reflexão sobre a vida é afável nesses momentos. Tanta coisa acontece, mas parece que foi rápido como a força de um sopro. Tudo que aconteceu acaba fazendo parte da vida, mas só o que me preocupa é o meu filho. Acho bom que ele tenha mudado os hábitos para comida e de academia. Agora esse bonde dele não dá. Vai acabar levando o meu garoto para o fundo do poço sem ter corda que o puxe de volta.
                Do mais o meu casamento e minha relação com a minha filha estão na mesma: ruim, mas dando para disfarçar.  Esse disfarce vai ser útil na reunião familiar deste fim de semana. As pessoas nesses momentos gostam de fazer as perguntas mais cruéis e indelicadas de forma dissimulada só para testar se está tudo certo com a gente. As pessoas pensam que família é um negócio unido e cheio de amor. Que nada! As pessoas gostam de parecerem e se sentirem maiores que os demais. É como se dissessem: “Eu dei certo e fui eficaz no meu papel e você não por pura incompetência!”. É difícil fazer parte desse julgamento disfarçado de confraternização. Todos se olham procurando defeitos e fraquezas nas relações de toda ordem.
                A única coisa que me preocupa é que a Tereza vai estar lá. O Henrique sempre fica olhando pra ela de um jeito muito esquisito. No fundo, acho que ele pensa que a vida dele teria sido bem melhor se estivesse com ela e não comigo. Essa coincidência da ex-namorada do meu marido casar logo com alguém da família é uma coisa de cinema. Até parece trama feita por escritor de novela para deixar as coisas suspensas até chegar a hora de fazer um conflito na história para prender o público. Se bem que eu acho que se fosse coisa de novela, até o autor ia achar exagero um negócio desse. Pra piorar, fiquei sabendo que o casamento deles não anda nada bem.
                Enfim, a vida sempre segue com muitas incertezas que eu torço para na realidade serem bem diferentes da minha imaginação. Nessas horas seria bom ser autora da minha própria vida e decidir o rumo dos fatos à minha volta, mas eles não dependem só de mim. Como faz? Esperar para ver no que dá e não ficar sofrendo antes da hora são o melhor a se fazer. Agora, quem disse que eu consigo? O jeito é tentar disfarçar, como eu sempre faço.

***

                É estranho escrever e saber que nunca serei lida por ninguém. Só que tudo tem seu lado bom. Talvez por isso eu consiga desabafar um pouco, já que é difícil dizer isso com a boca aqui em casa. A gente sempre tem vontade de dizer as coisas numa hora, só que elas podem piorar se não forem ditas do jeito certo, o que me faz calar.