sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Diário: 3 de janeiro de 2012


(Ilustração feita por Enthony Kevin exclusivamente para este blog)


3 de janeiro de 2012.

Passei um tempo sem escrever porque eu resolvi reler o meu ano antes de escrever mais sobre a vida de “um novo tempo, que começou”. O Natal na casa da família da Rayane foi muito bom. Conhecemos os pais dela, Lúcia e Roberto, e o apartamento que eles têm na 404 sul. É desses que nem elevador tem. Deu um trabalho para subir aquelas escadas, mas foi bom para queimar a rabanada do fim de ano. De uma coisa eu gostei: me deixaram livre da cozinha. A Rayane falou que os pais dela faziam questão de fazerem tudo em casa mesmo. Claro que depois ficou bastante subentendido que o Henrique e eu devemos retribuir nestas férias. Na verdade, só eu porque o Henrique não vai fazer nada mesmo.
O apartamento deles tem três quartos, um para eles, um para a Rayane e outro para o irmão dela, chamado Luiz, um moleque de 17 anos que só sabe falar de vestibular. Conversou até bem com a Giovana, mas deu para perceber que ele sabe de mais coisa que a Giovana sobre vestibular. Até no Natal eu sinto vergonha da minha filha. Mas não tenho do que reclamar, pois comi bem e dei umas risadas à toa por aí. Sair de casa, para mim, é uma espécie de libertação da vida que levo. Mas não adianta nada sair e ver as mesmas pessoas sem graça de sempre e sentir o mesmo clima pesada.
Na casa dos pais da Rayane foi muito bom, mas na casa do Agenor e da Aurora foi muito ruim. Além daquelas pessoas chatas e sem graça, tive de aguentar a perturbação do William, que botou na cabeça que quer ser chamado de Alana. Como era Natal, as pessoas resolveram abraçá-lo por educação, mas todos fizeram questão de dizer William, só não a Giovana que fez questão de chamar de Alana. O abraço deles foi mais demorado também. Muito ruim ver a minha filha incentivando esse tipo de bobagem na cabeça de um menino perturbado. Eles foram (não consigo escrever elas) foram até para dentro da casa. A Giovana depois me contou que o William mostrou um monte de poemas dele que ele queria que fossem publicados por ela. Ela disse que gostou, mas acho que não deve ser tão bom assim, afinal a minha filha nem gosta de ler de verdade para saber o que é poesia boa e o que não é. A vida é cheia dessas coisas mesmo.
Agora ver o Henrique dando um jeito para ficar perto da Tereza foi muito ruim. Ele sempre se aproveitava quando eu estava ocupada com alguma coisa para falar com ela, chegar perto e “ajudar” em alguma coisa. No final eles não ficaram sozinhos nunca nem aconteceu nada. Mas me pareceu ser aquele tipo de nada que significa tudo na intimidade das pessoas. Esse tipo de coisa realmente é importante de se perceber e mudar. Eu já percebi, agora falta fazer a outra parte que é mais difícil.
O Ano Novo foi na casa de um amigo do Henrique. Muito ruim. Ia ser melhor ficar em casa, e fazer qualquer outra coisa. O Henrique escapou por pouco de uma blitz da polícia umas quatro da manhã. O nosso carro passou e o carro seguinte foi parado. Foi uma tremenda sorte. E, para fechar o começo de ano com tudo, o Henrique caiu na cama e dormiu. Só dormiu, não sei porque eu me surpreendo ainda com isso.
Olhar para frente agora é um grande desafio para mim. Só vejo problemas à minha frente. O negócio é ir aguentando os desafios e os vazios da vida. Ando meio desanimada para escrever. Talvez eu me anime mais durante o ano. Estranho, porque as pessoas costumam ser mais animadas no início do ano. Até falei com minha família, mas para mim isso não tem importância, não por agora.  

(Esta é uma obra de ficção criada por Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Diário: 23 de dezembro de 2011

(Ilustração feita por Leonardo B. Ferreira para este blog)


23 de dezembro de 2011.

A vida parece que sempre tem um espaço para definido para as datas. Desde que eu sou criança o Natal tem um significado diferente. As pessoas mudam no fim do ano. Parece que são tomadas por uma espécie de atmosfera de paz. As pessoas se animam em fazer trabalho voluntário, fazem correntes do bem e até bolão da Mega-Sena o pessoal dá um jeito de fazer.

A cidade hoje deu uma mudada muito boa. Até a corrupção e a política deixaram de dar dor de cabeça para o povo. Caiu mais um ministro da Dilma, mas foi no início do mês. Agora já está bem tranquilo. Do jeito que a coisa anda para ela, um dia podem é botar a mulher mais poderosa do Brasil para o olho da rua. Neste país, tudo pode acontecer.

O ano não terminou, mas a televisão fica nos ajudando a reviver os momentos mais marcantes deste ano. Teve um massacre terrível numa escola lá no Rio de Janeiro. Nossa, a Giovana até ficou com medo de que algo do tipo acontecesse na escola dela. Com tanta coisa para o Brasil importar dos Estados Unidos, a gente resolveu importar logo esse negócio de fazer massacre em escola. Imagina só se eu fosse querer matar todo mundo que me fez sofrer. Não ia sobrar ninguém para contar história. A minha família estaria hoje em um cemitério e eu numa prisão, já que eu seria incapaz de me matar. Não que eu não esteja em um tipo de prisão, mas a da cadeia deve ser muito pior do que a que eu vivo aqui. A gente precisa aprender a importar dos outros países e das outras pessoas o que elas têm de bom e não o que têm de ordinário.

Na verdade, eu acho que estou escrevendo aqui mais para fugir da realidade. Ver Tereza e William, que quer ser chamado de Alana, no Natal vai ser bem chato. Eu ando com um pouco de irritação com a vida que chega. Essa falsidade de fim de ano para mim é insuportável. E ainda vou ter que aguentar a minha família de Minas no telefone. Ninguém diz que a vida é fácil, mas podiam falar sobre as dificuldades de se viver cada dia e como resolvê-las de vez em quando também.


(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Transição


Olá a todos!

Hoje teremos duas estreias aqui no blog em um único texto. Teremos duas novas seções para agitar este blog: “Supernova” e “Qualquer Coisa em Qualquer Lugar”. A primeira é destinada à publicação de textos de jovens amantes da arte, especialmente da literária. Nossa cidade e, principalmente, nossas escolas pecam bastante em não dar espaço para os estudantes inserirem seus trabalhos no seio da vida social de forma mais permanente. Talvez essa coluna ajude a reduzir a dívida que esta Capital tem para com talento dos nossos jovens.

A segunda será uma coluna feita por Any Beatriz Marques de Souza, jovem estudante que acaba de concluir o Ensino Fundamental com louvor. Ela irá sair do seu querido colégio e irá iniciar uma jornada desafiadora no Ensino Médio. E é justamente sobre essa transição que tratará a sua crônica de estreia, que será melhor entendida por quem conhece a Secretaria de Educação do Distrito Federal. Saber que crescemos e precisamos nos preparar para novos desafios e responsabilidades é mais necessário do que nunca. Aproveitem!

Transição

Antes mesmo de abrir a portinha da gaiola, um último alpiste, um último pedaço de bolo de aipim, uma última ida ao sol antes que comece a chuva, uma última frase metódica e um último canto.

Com as janelas fechadas sinto saudades de ir lá fora, mas tenho medo de nunca mais voltar para dentro e ficar sobre colo das cadeiras duras. Uma cadeia que guarda livros, guarda fogo que incendeia de maneira incontrolável cada alma cansada dentre as inúmeras paredes e janelas daquele local hostil e abominável, porém previsível e acolhedor.

Dentro das mochilas, pedras preciosas que logo serão substituídas por tijolos e pedregulhos; dentro dos blusões e moletons padronizados, existem corpos cansados e sedentos de conhecimento, aventura com ausência do abraço.

Sentirei falta dos ratos e dos insetos repugnantes, seguidos dos gritos estridentes que rangem os ouvidos, no entanto, não poderei evitar o crescimento, terei de deixar de lado primatas e entrar na ala dos elefantes e encará-los até eles me consumirem por inteira e deixar-me tornar alguém que mude um outro indivíduo ou apenas existir, um ser medíocre que só sobrevive e não vive. 

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Diário: 19 de dezembro de 2011

(Ilustração feita por Enthony Vieira)

19 de dezembro de 2011.

Hoje eu aproveitei para andar um pouco pela quadra depois do almoço. Arrumei um pretexto qualquer e resolvi sair sem ser incomodada. Passei pela paróquia aqui perto de casa e rezei um pouco na frente da igreja. Sem entrar, pois não queria dar a Deus o tempo que guardava pra mim.

Andando pela quadra reparei em muita coisa, mas teve uma que me fez parar para pensar bastante: como nossos bancos são vazios. Aqui na Asa Norte não faltam lugares para as pessoas sentarem e conversarem. Tem um bloco aqui na quadra cheio de bancos na parte de dentro e de fora. Só que nunca tem ninguém para sentado neles conversando. Fiquei com a impressão de que se eles desaparecessem ninguém sentiria a sua falta. Poderiam até se enganar dizendo que não poderiam mais ficar lá, sendo que nunca ficaram. Às vezes a gente fica se enganando muito nesta vida. Do jeito que esse povo é, tinha gente que era capaz de fazer abaixo-assinado e até manifestação pelos bancos que nunca usam só para fazer pose de pessoas conscientes. Esse mundo é muito estranho mesmo.

Lá no interior as pessoas não precisam nem de banco para sentar. Com dois bancos já transformam qualquer lugar em praça para as pessoas fazerem qualquer coisa. Talvez seja por isso que ninguém sabe da vida de ninguém aqui na Asa Norte. No interior, gente que você nunca viu sabe tudo da sua vida. Tem fofoqueira solteirona capaz de falar toda a vida das pessoas da cidade, principalmente dos defeitos de cada um. Acho que todo mundo aqui na cidade é capaz de falar dos defeitos dos outros, mas como ninguém faz questão de se falar, ninguém fica sabendo de nada.

Cada dia é uma nova reflexão que nos invade e toma a nossa atenção por instante que se perde na eternidade. Daqui a um ano nem vou me lembrar do que aconteceu hoje. Bem, talvez o diário me ajude a lembrar melhor o que aconteceu, mas só se eu inventar de lê-lo outra vez. Na verdade, eu nem sei se eu vou estar escrevendo no ano que vem. Vai saber como as coisas serão.

(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

domingo, 9 de dezembro de 2018

Ando Precisando de um Empréstimo de R$ 40.000,00


Ando Precisando de um Empréstimo de R$ 40.000,00

Fazia muito tempo que eu não escrevia aqui, mas hoje as circunstâncias foram bastante favoráveis à produção textual! 

Definitivamente, a maior obra ficcional da humanidade é o que acontece no dia a dia da América do Sul. Comecemos pelo futebol. Nem as mais criativas mentes de todos os tempos seriam capazes de inventar um enredo que culminasse na final da Libertadores sendo realizada em Madri. Sim, o principal torneio de clubes das Américas teve a sua finalíssima neste domingo na Espanha. O motivo? Uma multidão de perturbados vestidos com a camisa do River Plate apedrejou o ônibus do Boca Juniors e deixou os jogadores sem condições de disputarem em alto nível a partida mais importante do ano no continente. Adiaram o jogo para o dia seguinte e o Boca se recusou a jogar. O que a nossa Conmebol propõe como solução? Superando a inventividade de Murilo Rubião, Clarice Lispector e Guimarães Rosa, ela decidiu que a finalíssima seria realizada na capital da terra de Cervantes. Uma vergonha total.

O jogo foi a cara da Libertadores: polêmicas incompreensíveis à cognição humana, bolas desviadas geradoras de lances emocionantes, entradas desleais, provocações politicamente incorretas, incontáveis cartões, torcidas enlouquecidas, craques na arquibancada, jogadores com o dedo na cara do juiz, gol do Benedetto, acréscimos intermináveis,  prorrogação, ceras intermináveis protagonizadas por um goleiro fanfarrão, goleiro indo para a área tentando um gol de qualquer forma e uma virada incontestável. O River Plate começou o jogo muito mole e nervoso, mas, depois do intervalo, impuseram a sua qualidade contra o time do Boca e levantaram a taça em Madri, para a alegria de um mar vermelho que se transformou a Argentina neste domingo. Sem dúvida, a produtividade da população argentina vai cair bastante nesta segunda, o que vai ser uma dor de cabeça a mais para o presidente Macri.

Falando em presidentes, a rotina do Bolsonaro anda agitada. Ele, incapaz de comparecer aos debates por problemas ocasionados pelo bárbaro atentado sofrido três meses atrás, levantou a taça do Brasileirão no estádio do Palmeiras, numa cena do mais baixo populismo que só acontece na América do Sul. Na vida de agitador ele vai bem, mas na política as coisas andam complicadas. Assistindo ao noticiário vemos cenas que parecem saídas de páginas ficcionais. Moro, que negava convictamente a sua possível entrada para a política, aceita a “missão” de assumir um ministério para lutar contra a corrupção e, quando questionado sobre o caixa dois de um outro ministro, desconversa esclarecendo que o companheiro admitiu o erro e pediu desculpas, o que é um pressuposto básico da severa justiça que nos aguarda. Outra coisa inimaginável é Joaquim Levy, ex-ministro da desastrosa gestão petista, integrar a equipe econômica de Paulo Guedes. Nem mesmo o mais cruel opositor seria capaz de fazer isso para atrapalhar a imagem do futuro governo.  

Por fim, Bolsonaro agora está envolvido numa situação delicada envolvendo, segundo ele, um empréstimo. Como eu ando precisando de R$ 40.000,00! Com esse dinheiro eu daria uma entrada num financiamento imobiliário bacana para sair do aluguel de vez. Resolveria uma das minhas principais dores de cabeça. Infelizmente, não tenho tantos amigos prestativos e, principalmente, remediados assim na minha vida. Muitos andam desempregados e se virando para fechar as contas fora do vermelho. Que sorte tem quem possui amigos capazes de emprestar dinheiro para lhes ajudar em um momento de crise como este.


(Fernando Fidelix Nunes)

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

Diário: 16 de dezembro de 2011

(Ilustração feita por Enthony K. exclusivamente para este blog)

16 de dezembro de 2011.


Houve uma mudança de planos para o Natal. A Dona Aurora percebeu que muita gente não poderia ir na noite de Natal devido às outras famílias (ela está longe de ser a grande prioridade para as pessoas) que resolveu fazer um almoço de Natal para o dia 25. Para não descer do salto, muita gente adapta tudo aos seus interesses. A gente ficou meio sem saber o que fazer na hora desse anúncio, mas a minha querida Rayane veio com a solução na hora: vamos passar o Natal com a família dela. Essa menina me enche de orgulho! Como eu queria ter uma filha assim: inteligente, divertida e animada. Vai ser bom para fortalecer a união das famílias mesmo. Todo mundo concordo de bom grado com a ideia.

O Daniel está começando a pegar nas apostilas para concurso junto com a Giovana. Eles estão se ajudando a fazer umas questões de direito. Estavam resolvendo um monte de questões e conferindo os gabaritos. O Henrique aproveitou para comentar algumas coisas de uma tal de Lei 8.112. Ele disse que essa lei cai em todos os concursos da carreira federal. Eles ficaram muito animados em conhecer os direitos que terão no serviço público. Só o direito de poder tirar atestado médico e não precisar dar tantas satisfações depois do fim de um tal de estágio probatório deixou eles bem animados.

Eu queria muito que a minha vida fosse assim. Não precisar dar satisfações a ninguém e ficar em casa quando tiver uma justificativa qualquer para dar valor a mim mesmo. Agora, não tenho nem o direito de ficar deitada até tarde nenhum dia. A vida parece que tem um peso maior para mim. Acho que o caminho da vida estabeleceu curvas mais sinuosas para mim. Agora é ir vivendo e aproveitando o dia a dia com a família.

(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)