sexta-feira, 25 de maio de 2018

DIário: 15 de julho de 2011



15 de julho de 2011.

O Henrique resolveu sair hoje depois do almoço para jogar futebol e diz que não tem hora para voltar, pois vai fazer um levantamento de copo pesado hoje. É impressionante como os homens têm um jeito estranho de falar da vida. Eles fazem piada com a canalhice deles e acham isso assunto de piada e ficam se vangloriando. Se uma mulher faz a mesma coisa é julgada de outro jeito. Mulher que faz esse tipo de coisa é tratada igual lixo.

Eu escrevo mais hoje porque eu não preciso cuidar de mais ninguém além de mim. Cuidar do meu coração já é o suficiente para as angústias que eu sinto em meu coração. É bom ter esse tempo pra gente por um lado e ruim por outro. Sinto-me bem à vontade para escrever e devorar o Fernando Pessoa. Tenho aprendido a escrever melhor. É por isso que sempre dizem que ler ajuda a escrever. Sinto os meus vazios sendo preenchidos aos poucos com a leitura. É um livro muito bom mesmo. Ele é bem triste, pois fala bastante das angústias, mas é como se eu sentisse que ao ler alguém falando de uma dor que eu sinto como se ela se dissipasse aos poucos e ganhasse um outro sentido. Isso é necessário para todos nós, eu acho. A gente tem vontade de fazer sempre coisas melhores da nossa vida, o que atrapalha é o como.

Agora o lado negativo da solidão é o pensamento indo para caminhos que não são tão bons assim. A gente fica sujeito a qualquer tipo de pensamento sobre a vida e as angústias da dor. Eu ando fazendo muitas coisas. Tenho colocado umas coisas para jogar fora. Incrível como toda casa tem alguma coisa para se desfazer. Por que será que guardamos tantas coisas que não utilizamos? A Giovana mesmo tem um monte de livros que não usa nem pretende usar. Tem os livros de um tal de Dostoiéviski que ela comprou na promoção. É cada livro gigante, mas ela nunca abriu nem pretende abrir. É capaz de eu ler esses livros antes dela. O Daniel já não tem nada demais. Só umas roupas velhas que estão mofadas no fundo do armário.

Agora seria uma boa chance de reacender a chama do meu amor pelo Henrique e com a chance de refazer os desastres em que nos metemos. A gente bem que podia usar o dia para se amar como antigamente. Pedir uma comida, tomar um vinho do bom e se amar pela casa, sem se preocupar com nossos filhos. Por que as pessoas perdem o sentimento da chance de se amar de forma eterna por mesquinharias da vida? Devia existir um(a) artista capaz de dar às pessoas de volta essa vontade de amar de verdade. Onde estão os artistas que deixaram tudo na mão do sertanejo e do funk? São ritmos pra dançar numa festa. Mas e para cuidar da alma e das nossas verdadeiras angústias, onde estão os verdadeiros artistas? Sinto falta da inteligência que intimida nossas dores e aflições. Tem o Pessoa, mas ele morreu há muito tempo. Cadê alguém capaz de falar do nosso tempo? Às vezes eu tenho vontade de fazer um blog só para esfregar na cara das pessoas as verdades da vida, mas não como dona da verdade, mas sim da dúvida sobre as certezas que as pessoas têm. Tem tanta gente que acha que o casamento ou uma relação é capaz de apagar as aflições da vida, mas o papel dele é só nos dar suporte para perpetuar a nossa espécie neste planeta. O que é capaz de nos completar de verdade no dia a dia é a verdadeira arte. Queria ter descoberto isso antes e adoraria que as pessoas entendessem como uma obra de arte pode nos preencher de verdade quando achamos exatamente o que procuramos. Pena que na nossa sociedade as pessoas têm vergonha de querer ler e apreciar uma arte que vá além do momento. O brasileiro tem absoluta aversão pelo que é complexo. E quem tem um papel fundamental para mudar isso? Gente como a minha filha, que não pensa em fazer nada para melhorar as coisas. Está lá no Uruguai e nunca passaria um dia das suas férias para pensar em como resolver essa verdadeira tragédia. Tem gente que tem poder e não percebe a força que tem para mudar a situação.

(Escrito, assim como os demais dias do diário, por Fernando Fidelix Nunes)

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