quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Diário: 18 de janeiro de 2012

(Ilustração feita por Leonardo B. Ferreira exclusivamente para este blog)


18 de janeiro de 2012.


Como as coisas conseguem piorar em uma semana. Depois que o Henrique voltou, já de madrugada, eu tentei falar com ele que a gente não resolvia as coisas assim na nossa família. Ele não quis conversa e disse "não quero falar agora, Márcia". E foi deitar.

Nos últimos dias tem sido muito difícil para mim aqui em casa. O Henrique e a Giovana mal se falam. Na verdade eles nem se falam. O Henrique agiu como uma criança de dez anos e, ao ver a Giovana e eu no sofá da sala, simplesmente disse “tchau, Márcia”. A Giovana fingiu que estava tudo bem e continuou assistindo ao jornal na televisão.  É como se eles estivessem numa queda de braço para ver quem vai dar o braço a torcer primeiro. A Giovana até falou no celular depois com uma amiga um pouco do assunto e disse que macho nenhum vai mandar nas opiniões dela ou no corpo dela. Nem mesmo o próprio pai. Ela ainda falou umas coisas com a palavra patriarcado no meio que eu não entendi direito. 

O Henrique veio aqui hoje com uma conversa bem estranha de que anda precisando de dinheiro para pagar umas dívidas com urgência. Eu fiquei me perguntando: de onde saiu essa dívida? Na verdade, eu não guardei essa pergunta só para mim, eu a fiz diretamente. Ele só disse que eu não sabia como andam as contas e que o salário não anda dando para cuidar de todas as coisas aqui de casa. Agora eu não entendi, porque a gente não viaja nem nada. Não lembro nem do último crediário que a gente fez. Ele falou que tinha que arrumar um jeito de conseguir dez mil reais para ajeitar as coisas do jeito certo. Não sei de onde vem isso, só se a mesada do Daniel aumentou em dois mil reais e eu não fiquei sabendo direito. Isso é muito estranho mesmo.

Resolvi ler de novo o Livro do Desassossego para ver se me animo de novo ou pelo menos encontro mais ânimo na melancolia. No trecho 411 do Fernando Pessoa, ele faz uma excelente reflexão sobre a relação entre vaidade e orgulho. De cara ele diz: “O orgulho é a certeza emotiva da grandeza própria”. Embora o resto tenha valor, eu fico presa a essa frase, pois acho que a minha família tem uma certeza da grandeza própria estando muito longe dela. E isso é uma coisa de Brasília mesmo. No interior, as pessoas idiotas sabem que são imbecis e tentam dar golpes estranhos. Em Brasília, deve ser por conta do poder da cidade, as pessoas têm absoluta convicção de que são muito mais do que realmente são. Triste saber que as coisas são como elas são.



(Esta é uma obra de ficção criada por Fernando Fidelix Nunes)

Nenhum comentário:

Postar um comentário