sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Diário: 25 de outubro de 2011


(Ilustração feita pelo talentosíssimo Enthony Vieira exclusivamente para este blog)



25 de outubro de 2011


Que deprimente a ida dos meus filhos na manifestação. Quando eles voltaram aqui em casa com os cartazes sobre a manifestação, eu senti uma certa vergonha deles. Normalmente os pais e as mães sentem orgulho ao verem seus filhos sonhando e se manifestando para construir um país melhor, mas eu senti vergonha, muita vergonha. Se eu fosse lida, eu tenho certeza que iam dizer que eu sou uma mãe que não gosta dos filhos, mas isso é mentira. Eu amo meus filhos, e é por isso que eu sofro por eles. Eles escreveram coisas imbecis nos cartazes. Eles diziam algo assim: “A saída não é pela direita nem pela esquerda, é pelo fim da corrupção”, “O Brasil que eu quero tem mais educação”, “A luz que todos precisam é o senso crítico”, “A mulher que manda no seu corpo” e assim por diante.

São frases atraentes para olhos inocentes, mas que não mudam nada. Eu nunca conheci uma pessoa que mudou de ideia depois de ter lido um cartaz numa manifestação. Ninguém muda nada por ter lido um cartaz. Depois de um livro pode até ser, mas nunca depois de um cartaz. Cartaz é texto de primário. Só serve para enfeitar escola e fazer as pessoas “falarem” em manifestações. Esse povo acha que está mudando muita coisa quando não faz mais do que aparecer. Eles estavam até falando que tinha televisão filmando. Para fazer o que com isso? Nunca vou entender essa gente e também não faço a menor questão. Só perco tempo com isso.

Se eu tivesse um cartaz para escrever seria: “quero saber se sou traída mesmo”, “traição não é solução”, “o silêncio é a pior coisa que podem nos dizer durante a dor” (isso cairia melhor numa faixa para tomar conta do Eixo Monumental), “a saída é começar tudo de novo”, “quem acredita sempre é trouxa”, “intolerância é a tolerância que temos com a mediocridade”, “o sofrimento não é a terceira via” e “brigar pra que se ninguém me vê”. Estamos sempre nesse silêncio com o mundo que nos rodeia. As pessoas querem falar sem ouvir ninguém ao seu lado. Se começamos a década assim, não consigo imaginar como terminaremos esse prenúncio do caos inconformado.

Nossa... reli o que eu escrevi e vi que o Fernando Pessoa anda fazendo efeito em mim. Também, depois de ler o trecho 349, não dá para escrever qualquer coisa. Ele diz que a confidência é a mais vil de todas as necessidades. Livrar a alma do peso dos segredos realmente é bom para que nós sobrevivamos às nossas vidas. Sempre vai doer, isso é fato, mas não pode ficar tão ruim assim. O negócio é ir vivendo mesmo e aguentando Henrique, Tereza, Giovana, Daniel, Rayane, Dona Aurora e um país que parece ir pro precipício.


(Esta é uma obra de ficção feita por Fernando Fidelix Nunes)

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