domingo, 1 de julho de 2018

A Diferença Entre os Meninos e os Homens na Copa da Rússia


A Diferença Entre os Meninos e os Homens


         Tenho tirado muitas reflexões com a análise desta Copa do Mundo. Infelizmente, a necessidade de publicar os textos, que são absolutamente perecíveis se comparados a um ensaio, me faz correr com a escrita e não terminá-la como gostaria. Mas crônica que segue.

A Argentina não sabe perder nem aprender com a derrota. Isso soa estranho para uma seleção que perdeu e sofreu todo tipo de vexame nos últimos 25 anos, mas é a pura verdade. Apesar de França e Argentina terem conseguido fazer um esplêndido 4x3 para a seleção da terra de Balzac, Victor Hugo e Flaubert contra a seleção da terra natal de Borges e Sabato, o resultado não demonstrou o jogo. A todo instante a Argentina estava rendida, isto é, os argentinos já aceitavam a derrota antes mesmo do fim do jogo. O observador ou a observadora mais distraídos podem até pensar que, quando nossos rivais fizeram o terceiro gol e foram correr atrás do milagroso quarto, era um time com raça e tentaria ir até o fim. Pelo contrário, em vez de deixar o jogo fluir, eles já arrumaram uma confusão tosca e imbecil, recorrente em competições sul-americanas. Pareceu que eles fizeram isso inconscientemente para atrapalhar a si mesmos. Eles mesmos perceberam que não eram dignos do título e, como eu já disse em outra crônica, os argentinos deixaram o presente de lado e viveram das dores do passado e do iminente resultado adverso futuro, o que é a certeza absoluta da frustração no esporte e na vida.
         
        Vale a pena fazer um exame detalhado de Messi. O craque argentino andava pelo campo o tempo todo cabisbaixo. O time errava um chute, Messi ficava introspectivo e cabisbaixo. O time levava um gol, Messi olhava para baixo como se estivesse procurando algo. E, de fato, ele estava procurando. Ele procurava a si mesmo. Um homem considerado o melhor do mundo no que faz não ser capaz de transformar a sua habilidade individual em um título coletivo por seu país deve ser um paradoxo incompreensível para sua mente. E é assim a vida também: quanto mais ficamos imersos nos nossos pensamentos mais sombrios, mais nos tornamos vulneráveis à derrota e à sorte alheia. Ele não foi capaz de ver que o que ele procurava estava o tempo todo à sua disposição: técnica, raça e sorte. Só que olhando para baixo, não foi capaz de enxergar o óbvio.

Embora seja um jogador argentino, no fundo, por baixo de uma alegria singular com o vexame hermano, sinto um pouco de empatia por Messi. Não digo pena, porque pena é o pior sentimento que podemos ter por alguém. Sentir pena significa a mesma coisa que sentir que a pessoa não merece que sintamos mais nada por ela. Enfim, falarei disso em outro momento, voltemos ao Messi. Olho para Messi em campo e vejo o ser humano viver alguns dos mais diversos paradoxos de nosso tempo. Como o melhor não consegue o melhor título? Como o melhor do seu grupo não consegue representar o seu grupo da melhor maneira? Isso não é pouca coisa para um ser humano. Se fosse a primeira Copa tudo bem, mas ele passa por isso há mais de uma década e já saiu derrotado de formas traumáticas em outros mundiais, que foram tão frustrantes quanto o atual.

Como consolo para imagem de Messi, sobrou a eliminação de seu maior rival, Cristiano Ronaldo. Digo consolo para imagem, porque me parece que essa frustração não tem qualquer consolo na alma do craque argentino. Cristiano Ronaldo não conseguiu vencer nossos raçudos vizinhos. Qualquer um que acompanha minimamente a Libertadores sabe que a catimba e a retranca uruguaias eram previsíveis. E é aí que se separam os meninos dos homens. Cavani, que foi colocado na posição de mero coadjuvante no PSG, se viu diante da oportunidade de ouro de vencer e se tornar herói de sua seleção. Teve duas boas chances e consolidou a classificação. Depois que conseguiram a vantagem, os jogadores de Portugal foram colocados no bolso pelos compatriotas do saudoso Mario Benedetti e por uma estratégia simples: 8 jogadores de linha atrás do meio-campo e dois jogadores prontos para correr desesperadamente e dar um jeito de enrolar o jogo. Teve um jogador uruguaio que, no primeiro tempo, teve a capacidade de pedir para que a bola fosse trocada antes da cobrança de um lateral. Tenho certeza absoluta de que a bola estava normal, mas essa enrolação é tão pilantra e atípica que os descobridores destas terras tupiniquins não conseguiram achar uma reação para resolver essa picaretagem. Como insisto em dizer: são meninos, não são homens.

Cristiano Ronaldo é um craque, sem dúvidas, mas ainda não mostrou merecer a Copa. Ele deixou uma barbicha esquisita de bode crescer para dar uma resposta midiática à sua rivalidade com Messi. Não sabe por que ele fez isso? Vá procurar no Google e entenda! Ele, assim como o Messi e os argentinos, não estava pronto para vencer uma Copa. Eles são meninos que são facilmente dominados e subjugados por seus rivais, pensamentos e crenças se estes forem capazes de jogar em cima de suas fragilidades.

Neste domingo, Rússia e Croácia deixaram uma pergunta a ser respondida: será? Será que podem ser uma zebra histórica e levantar o troféu mais cobiçado do planeta Bola? Eu acho que não, mas estamos falando de futebol. Em futebol tudo é possível se tivermos uma postura madura e uma combinação sólida entre tática e técnica. A Rússia segurou o empate, pois sabia de sua capacidade de decidir nos pênaltis e é como eu me canso de repetir aqui: goleiro metido a galã não é vitorioso. Vejam o goleiro da Espanha. Badalado, arrumado e vaidoso. Pegou quantos pênaltis? Nenhum! O goleiro russo, muito mais humilde nesses aspectos, apesar de um comentarista ter dito que ele é conhecido por falar “treinar pra quê, se eu sei o que fazer?” (sim, o futebol de verdade ainda respira por aparelhos graças a posturas desse nível de sabedoria), pegou dois pênaltis com propriedade para fazer a festa na sua terra, que tem tudo para bater o recorde de consumo de vodca neste fim de semana. Recorde com a meta em aberto, pois outro triunfo pode dobrar a meta. A Croácia jogou sabendo que ia passar de qualquer jeito. Nem se importou com um ou outro perrengue. Uma verdadeira comodidade de dar inveja a muito burocrata por aí. Os jogadores bateram os pênaltis de qualquer jeito. Jogo feio, era melhor assistir ao filme do Pelé.

E o Brasil? O Brasil só Deus sabe no que pode dar. Dizem que Deus é brasileiro, e aí está o problema. O brasileiro, quando não vê a sua seleção jogando o futebol genuinamente nacional, torce contra. Nesse ponto, é perigoso saber para onde Deus destinará os seus milagres. Lágrimas falsas e exibicionismo, definitivamente, não são bem vistos pelos seus valores. E ainda é o México. Ninguém sabe como jogará a seleção mexicana, nem eles mesmos sabem o que vão fazer. O técnico Osório é um estrategista poderoso e irregular, pois monta esquemas táticos com virtudes e defeitos entrelaçados em si. O esquema mexicano é de uma estética similar à de Gregório de Matos: cheio de contrastes e um rebuscamento incompreensível ao apreciador moderno. Acho que passamos passando raiva, mas passamos. Pelo menos será mais um dia em que beber antes de meio-dia não será considerado alcoolismo.
(crônica escrita por Fernando Fidelix Nunes)

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