sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Diário: 2 de novembro de 2011

(Ilustração feita por Enthony Vieira exclusivamente para este blog)

2 de novembro de 2011.

Nascer no dia dos mortos deve ser uma sentença de que a pessoa carregará consigo uma energia terrível por toda a sua limitada existência. Deve ser o tipo de pessoa que traz a morte nos olhos e nas suas ações. Na verdade, eu estou só especulando. O Daniel mesmo nasceu no 7 de setembro e não dá conta de fazer nada que preste sozinho. Não me lembro nunca de ter conhecido ou de ter ido ao aniversário de alguém que nasceu no dia dos mortos. Mas eu também nem conheço tanta gente assim para falar das pessoas. Só conheço mesmo a minha família, e olhe lá.

Conheci muita gente nesta vida, mas é como se eu não conhecesse ninguém de verdade. Sabe, conhecemos as pessoas por máscaras. Atrás de cada atuação existe uma história e uma profundidade tremenda. Pego isso pelo livro do Fernando Pessoa mesmo. O personagem dele, na ficção, deveria ser visto como apenas um homem esquisito que não tinha muito a oferecer às pessoas, daí ele deixou uma obra maravilhosa e profunda. Acho que se as pessoas escrevessem, deixariam coisas maravilhosas de seus corações para as outras pessoas. Afinal, nem tudo é o que parece.

Acho que a Rayane domou o Daniel de um jeito muito estranho. Ele era um bêbado que não estava levando nada a sério neste mundo. É como se ela tivesse domado o espírito bruto do meu filho e tivesse trazido uma paz a ele impressionante. O estranho é que eu não entendo muito bem o porquê disso. Acho que foi só pelo sexo mesmo, porque eles são diferentes em tudo. Ela é bem mais quieta e na dela. Quando sai, é para ir com as amigas para um bar bem discreto ou uma dessas festa de rock. Não vi ela até agora falando de bebida com a gente nem de nada exagerado. No fim eu gostei dela, ela conversa com uma voz divertida tão bem sobre tantas coisas que estão ao nosso redor que eu me sinto meio hipnotizada por ela. O Henrique também aprovou a menina.

Agora a Giovana com esse argentino dela não tá com nada. Como pode uma menina que eu criei com tanto carinho ter ficado tão boba? Namorar alguém por ser um estrangeiro depois de uma aventura de semanas é um atestado de carência e estupidez. Mas a vida é cheia dessas idiotices. Afinal, só temos duas certezas nesta vida: que vamos morrer e cometer erros vergonhosos. Isso é muito fácil de falar, mas muito difícil de viver. Fico com pena da minha filha. Não deve ser nada bom ter um relacionamento assim. O pior que ela quer que o namorado venha para cá. Pelo visto o Henrique não gostou nada da ideia, mas isso só vai se resolver lá para dezembro ou janeiro.

Eu estou falando muito dessas coisas, mas não tenho muita moral para falar a respeito de relacionamentos. Casei com um homem que é incapaz de se abrir de verdade para mim. Não sei o que vai ser daqui pra frente, mas é provável que nada mude de verdade. Eu penso em muitas coisas que podem acontecer, mas no fim eu sei que nada vai mudar. Comigo, tudo muda para não mudar nada.

Pensei na minha mãe esses dias. Realmente, era uma mulher maravilhosa. Pena que ela não está aqui para me ouvir e me orientar mais. A gente sempre pensa que as coisas não vão acontecer conosco, mas acontecem. Nunca pensei que iria perdê-la assim. Só que a vida não para e nós temos que continuar e sermos fortes diante de tudo que está na nossa frente. Pena que eu não sou capaz de olhar para o futuro com um olhar positivo. Se o país pelo menos me animasse um pouco, mas não anima nem um pouco dentro de mim.

(Esta é uma obra de ficção escrita por Fernando Fidelix Nunes)

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